AÇÃO nº.: 0000078-88.2011-805.0127
AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA BAHIA
RÉU: Marcos XXX

SENTENÇA


1. RELATÓRIO           


    O Ministério Público ofereceu denúncia em face de Marcos XXXXXX, vulgo “Marcos XXXXX”, qualificado nos autos, pela prática em tese, dos crimes tipificados nos Arts. 12 da Lei nº 10.826/03 (Estatuto do Desarmamento) e art. 28 da Lei 11.343/06 (Lei de Drogas).
    Narra a denúncia, em síntese, que no dia 01 de março de de 2011, por volta das 6:00h, em cumprimento a mandado de prisão, o acusado foi preso em flagrante, dentro de casa, na cidade de Itapicuru-BA, na posse ilegal de uma arma de fogo, pistola marca Taurus, calibre 380, PT Plus, e 21 projéteis intactos de igual calibre.
    Na mesma ocasião, foi encontrada uma cápsula com substância proscrita e entorpecente, conhecida como cocaína,  que, segundo a acusação, seria para uso pessoal do réu.
    A denúncia foi ofertada com lastro em inquérito policial nº 113/2011, cujas peças principais são: auto de Prisão em Flagrante (fls. 02/04); auto de apreensão (fl. 12); auto de constatação de substância preliminar entorpecente (fls. 13), cópia de 02 mandados de prisão oriundos de Sergipe, termo de interrogatório do denunciado referente a outro processo onde é apontado como autor de homicídio em Olindina-BA (fls.22/23); boletim individual (fls. 34); relatório (fls. 41); laudo pericial da ama(fls. 60), e laudo de exame pericial em 09 aparelhos celulares encontrados com o réu (fls. 64).
    A defesa preliminar foi apresentada na fls. 40/53.
    A denúncia foi recebida em 20/04/11, conforme se depreende da decisão de fls. 54.
    A Folha de Antecedentes Criminais do acusado foi juntada aos autos às fls. 74 e certifica que o mesmo não registra antecedentes criminais.
    O Ministério Público apresentou alegações finais às fls. 131/133, aduzindo em suma, que ficou demonstrado, pelo conjunto probatório dos autos, que o acusado praticou os delitos de posse de arma de fogo, previsto no art. 12  do Estatuto do Desarmamento, sem possuir autorização legal para tanto, bem como requer a condenação do acusado na pena do art. 28 da Lei de Drogas.
    A defesa também, em alegações finais, informa que a arma estava desmuniciada e, por isso, a conduta seria atípica, requerendo, a absolvição e, caso condenado, seja aplicada a pena mínima, ao tempo em que requer restituição da motocicleta e dos R$ 836,00 apreendidos.

        É o relatório. Decido.

            Não havendo preliminares, passo direto à analise do mérito.


2. FUNDAMENTAÇÃO

    Trata-se o presente feito de processo criminal em trâmite neste Juízo, onde Marcos Oliveira dos Santos, vulgo “Marcos Gago”, qualificado nos autos, foi acusado pela prática dos crimes previstos no art. 12 da Lei nº 10.826/03 e art. 28 da Lei de drogas (lei11.343/06).
    A materialidade dos crimes ficou devidamente provada nos autos com a apreensão da pistola, marca Taurus, calibre 380 e da substância preliminar entorpecente (fls. 13), no interior da casa do denunciado MARCOS, conforme se depreende de fls. 02/03, bem como dos laudos periciais da ama e da aludida substância estupefaciente (fls. 60).
    A autoria do crime, por sua vez, é demonstrada uma vez que o  próprio acusado confessou na Polícia e, em Juízo, que realmente a arma era sua quando foi abordado pelos policiais, conforme se evidenciará pela provas abaixo elencadas:
    No seu interrogatório judicial, (fl.107), o denunciado confessou que a arma e a substância entorpecente eram de sua propriedade. Vejamos:

“Que entraram em sua residência e encontraram uma pequeníssima quantidade de cocaína, numa cápsula (…); Que depois que arma foi exibida na DP, este confirmou que era proprietário dela; Que o interrogado reconhece que a arma era sua, que usava para defesa pessoal; (…) Que é usuário drogas há cerca de 06 meses; Que já foi preso por porte de arma em Sergipe; Que também já respondeu a um processo por roubo em Lagarto-SE (….);


    Realizada audiência de oitiva das testemunhas, foram colhidos os depoimentos tendo a Primeira testemunha, policial civil, dito, na fl. 104, resumidamente, que chegando na residência do acusado, como mais 04 ou 05 agentes policiais, antes de o acusado abrir a porta, ouviu barulho como se alguém estivesse escalando a parede, cercando a a casa do acusado, pois suspeitavam que ele poderia fugir. Em seguida, segundo a testemunha, adentrou na residência e encontraram vários aparelhos celulares, substância entorpecente  referida acima, projéteis intactos.
    Segundo a aludida testemunha, notou que a parede da casa tinha manchas, como se alguém a houvesse escalado, tendo um dos agentes policiais, ao subir na parede, logrado êxito em encontrar a referida pistola, modelo 380, em cima da laje. Após, ainda conforme a testemunha, o acusado afirmado que a droga era de  uso pessoal e a arma  para sua defesa pessoal. Referida testemunha disse que o réu tinha mandado de prisão por homicídio, em Sergipe, e era suspeito de praticar outro homicídio em Olindina-BA.
    A 2ª testemunha de fl. 128 também confirma que foi encontrada, na casa do acusado, uma arma de fogo, pistola 380, escondida na caixa d'água, dizendo, ainda, que ele respondia a processo por homicídio e porte de arma na cidade de Lagarto-SE. 
    Assim, os testemunhos ratificam a versão do acusação, não havendo como acolher a tese da defesa.
    Ficou comprovado nos autos que o réu tinha consciência de que é ilícito penal portar arma de fogo em desconformidade com a lei, pois tentou até esconder a arma, sendo  que o tipo penal é possuir arma de fogo, desmuniciada ou não, pois se trata de  crime de perigo abstrato e de mera conduta, eis que se protege a columidade da sociedade.
    Neste sentido, eis a jusrisprudência:

    “TJMG: Des.(a) MATHEUS CHAVES JARDIMData do Julgamento:    
Data da Publicação:     29/03/2011 Ementa: APELAÇÃO CRIMINAL - PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO - AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS - ARMA DESMUNICIADA - IRRELEVÂNCIA - ABSOLVIÇÃO - IMPOSSIBILIDADE - - ERRO DE PROIBIÇÃO - INOCORRÊNCIA - ATENUANTE DE CONFISSÃO ESPONTÂNEA - REDUÇÃO DA PENA AQUÉM DO MÍNIMO LEGAL - IMPOSSIBILIDADE- PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA E MULTA - CUMULAÇÃO - NÃO VEDAÇÃO - NATUREZA DISTINTA - RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. -(....) O crime de porte ilegal de arma de fogo, tipificado no artigo 14 da Lei 10.826/03, é de mera conduta e de perigo abstrato, de modo que o simples porte de arma de fogo de uso permitido é bastante para configurá-lo, independentemente de a arma estar municiada ou não. -As circunstâncias atenuantes não têm o condão de reduzir as penas aquém do mínimo legal, conforme orientações constantes das Súmulas 231 do Superior Tribunal de Justiça e 42 do Tribunal de Justiça de Minas Gerais. -Não há óbice à cumulação da pena de multa com a de prestação pecuniária, tal como determinada em sentença, haja vista a natureza diversa das reprimendas. -Recurso conhecido e não provido.”

    De outra banda, não há falar em “abilito criminis temporária, pois esta só perdurou até 31/12/2009, e o crime de posse de arma ocorreu em março de 2011.
    A descriminalização prevista nos arts. 30 a 32 do Estatuto do Desarmamento, que diz respeito aos ''possuidores e proprietários de armas de fogo'', tornou atípica a conduta da posse irregular de arma de fogo até 31/12/2009, quando foi prorrogada pela Lei nº 11.922/09.

    Assim, tem decido nossos Tribunais

“TJMG Data da Publicação:     06/10/2010 Ementa: APELAÇÃO - POSSE ILEGAL DE MUNIÇÃO - ABOLITIO CRIMINIS TEMPORÁRIA - LEI 11.922/09 - ATIPICIDADE - RECEPTAÇÃO - PROVAS INSUFICIENTES PARA UM DECRETO CONDENATÓRIO - ABSOLVIÇÃO QUE SE IMPÕE. 1. Em decorrência da abolitio criminis temporária trazida pela Lei 11922/09, configura fato atípico possuir arma de fogo ou munição sem registro até a data de 31/12/09. “.”


    Assim, as testemunhas arroladas na denúncia e inquiridas em Juízo, associada  à prisão em flagrante, autos de apreensão da arma e da droga e os  laudos respectivos  trouxeram informações harmônicas entre si e em consonância com os fatos arrolados na denúncia.
    A testemunha “declarante”, arrolada pela defesa, companheira do acusado, tentou amenizar as condutas do acusado, e nada trouxe de novo em relação ao fato em debate (fls. 106).
    Com isso, não resta dúvida de que o Réu foi o autor dos delitos em tela, ainda mais que foi preso em flagrante delito, “a certeza visual do crime”, como bem asseverava o doutrinador Julio Mirabete.
    Portanto, encontra-se claramente comprovada a ocorrência material dos fatos, bem como esclarecida sua autoria, a qual deve recair sobre a pessoa do acusado..

3.DISPOSITIVO

    Face ao exposto, considerando todos os elementos trazidos aos autos, julgo PROCEDENTE o pedido formulado na denúncia de fls. 02 para CONDENAR o réu Marcos XXXXvulgo “Marcos XXXXX”, como incurso nas penas dos arts. 12 da Lei 10.826/03 c/c o art. 28 da Lei 11.343/06. c/c art. 69 do CP.

    Passo, em seguida, à dosimetria da pena a ser aplicada, em estrita observância ao disposto no art. 68, caput, do CP.

           
        DOSIMETRIA  

CRIME DE USO DE DROGAS

    Analisando-se as diretrizes constantes no art. 59 do CP, observo que o réu agiu com culpabilidade normal à espécie; não possui maus antecedentes em virtude do teor de fls. 74; sobre a sua personalidade, trata-se de pessoa voltada ao crime, com outras passagens por crimes em Sergipe e até na Bahia; conduta social: péssima. desempregado e não é só usuário de drogas; o motivo do delito é satisfazer vício pessoal; as circunstâncias do crime: foi encontrado com 09  aparelhos celulares, mais de R$ 820,00 em dinheiro, em casa; a conduta do réu não ocasionou conseqüências outras a serem consideradas; e, por fim, o comportamento da vítima não motivou a prática do delito, eis que a vítima não é individualizada.

    Assim, fixo como pena ao acusado, pelo crime de uso de drogas, aplicação de medida educativa a ser recebida no CAPS do município em que estiver domiciliado, assim que for liberado do cárcere, pelo prazo de 2 meses, consistente em tratamento para desintoxicação, pelo prazo de 2 meses, nos termos do art. 28, III, da Lei 11.343/06.

CRIME DE POSSE ILEGAL DE  ARMA

    Pelo crime de Posse ilegal de arma, analisando-se as diretrizes constantes no art. 59 do CP, observo que o réu agiu com culpabilidade intensa, pois ainda tentou se livrar da ama, escondendo-a na laje de casa; não possui maus antecedentes em virtude do teor de fls. 74; sobre a sua personalidade, trata-se de pessoa voltada ao crime, com outras passagens por crimes em Sergipe e até na Bahia, suspeito até de ter combinado com comparsas de ser “resgatado” no dia da audiência criminal deste processo quando tivemos de requisitar força pública, quando tivemos mais de 15 policiais ao redor do Fórum
; conduta social: péssima, usuário e drogas; o motivo do delito é se aparelhar por estar envolvido com uso e venda de drogas; as circunstâncias do crime: foi encontrado com 09  aparelhos celulares, mais de R$ 820,00 em dinheiro, em casa, situação típica de quem não é só usuário; a conduta do réu não ocasionou conseqüências outras a serem consideradas; e, por fim, o comportamento da vítima não motivou a prática do delito, eis que a vítima não é individualizada .

    Logo, havendo muito mais circunstâncias judiciais desfavoráveis, fixo a pena-base para o réu em 02 (dois) anos e 10 meses de detenção, e 120 (dez) dias-multa, compatível com as condições econômicas do réu.
    Diante da confissão do acusado, reduzo a pena, antes aplicada, em 05 meses e em 30 dias- multa.
    Não havendo circunstâncias agravantes ou causas de diminuição ou aumento  de pena, torno definitiva a pena em 02 (dois) anos e 05 meses de detenção e 90 dias-multa, a razão de um trigésimo do salário mínimo, em regime semi-aberto, além da pena de medida educativa, consistente em desintoxicação, pelo prazo de 2 meses a ser APLICADA no ÒRGAO do município, em que estiver domiciliado, assim que for liberado do cárcere.
    Incabíveis o benefício do art. 77 porque a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social, e a personalidade do agente, os motivos e as circunstâncias do crime não o autorizam. Por estas mesmas razões, nego ao Réu o benefício encartado no artigo 44, do Código Penal, conforme a ressalva feita pelo inciso III, in fine, do citado artigo, eis que a substituição de pena para ele não é suficiente para corrigir o comportamento criminoso que vem tendo.
    Em concordância com o disposto pelo artigo 33, parágrafo 3º, do Código Penal e atento às Sumulas 718 e 719  do STF, considerando as circunstâncias judiciais desfavoráveis, o Réu deverá iniciar o cumprimento da respectiva pena privativa de liberdade em Regime semi-aberto, motivo por que não podem, em caso de recurso, fazê-lo em liberdade haja vista estarem presentes os requisitos da prisão preventiva, além de ter passado a instrução toda preso e assim permanece até a presente data.
    Presentes a prova da existência do crime e indícios  de autoria, para a preservação e garantia  da ordem pública, diante dos fatos criminosos a que o réu responde, como homicídio e porte de arma, em Lagarto-SE, homicídio em Olindina-BA, nos termos do art. 312 do CPP, deve ser mantida a custódia cautelar para que o réu não volte a delinquir.
    Se, para condenação por tráfico, o MP não descreveu a narração da conduta como tal, daí tivemos que enquadrar o 2º Crime no art. 28 da Lei referida, para a apreensão dos instrumentos ou produtos do crime bastam indícios suficientes de origem ilícita,(art. 60 da Lei 11.343/06), motivo pelo qual decreto a apreensão da motocicleta e dos 09 aparelhos celulares apreendidos, até nova decisão em contrário, facultando-se ao réu, em autos apartados, fazer a prova da origem ilícita, no prazo de 5 dias, restituindo-se-lhe, porém, a quantia aprendida de fl. 09 e depositada em conta, fl. 92 .
    Oportunamente, após o transito em julgado desta decisão, tomem-se as seguintes providencias:
1. Lance-se o nome dos Réus no rol dos culpados;
2. Oficie-se ao CEDEP, fornecendo informações sobre o julgamento do feito e ao Tribunal Regional Eleitoral deste Estado, comunicando a condenação dos Réus, com suas devidas identificações, acompanhada de fotocopia da presente decisão, para cumprimento do quanto disposto pelos artigos 71, parágrafo 2º, do Código Eleitoral c/c 15, III, da Constituição Federal.
3.  Oficie-se ao CEDEP, fornecendo informações sobre a condenação do Réu.
        Custas pelo Réu (art. 804 do CP).                       
       
        P.R.I.

ITAPICURU-BA, 16/02-12

J.BRANDÃO
Juiz"

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