Promotor de Justiça comenta sobre portaria do "Toque de Acolher"
Meu caro doutor, lamentavelmente só posso falar sobre os efeitos de
uma medida desse quilate na sociedade local, já que em Nazaré das
Farinhas, por exemplo, e que entendo como primeira cidade a adotar o
"toque de acolher" na Bahia, e isso ocorreu em 1994, enquanto durou o
controle de circulação dos jovens ainda em idade carecedora de
proteção, foi um sucesso. Até hoje a sociedade local agradece nossa
iniciativa, e que tomei em face de sempre ter visto o ser humano como
ente possuidor de liberdade garantida no ordenamento jurídico, mas que
deve sempre ser exercida com responsabilidade, com limites. Assim,
demonstrando-se ele irresponsável no uso desse direito, alguém há que
lhe cobrar condutas, a começar pelos próprios pais e responsáveis. Se
estes falham, ou se tornam hipossuficientes porque despreparados para
o exercício do pátrio poder, o Estado, porque detentor do poder-dever
de educar e zelar pela cidadania e pelo bem estar social, intervêm.
Foi o que fiz enquanto órgão estatal encarregado da defesa da
sociedade, especialmente dos seus entes ainda em formação moral,
social e psicológica, presas fáceis para aproveitadores de toda
espécie, notamente os traficantes.
Por outro lado, nota-se, sem muito esforço, que no Brasil a violência
passou a ser um dado do cotidiano, e ela sempre está onde tem drogas,
álcool, embalos irresponsáveis, orgias de toda ordem. Ademais, sabe-se
que o narcotráfico se instalou em todas as camadas da população. Hoje
ele não mais se concentra nos morros, favelas ou na periferia. Está na
alta sociedade, nas mansões, nos condomínios de luxo, nas ruas, nas
praças, enfim, alastrou-se como um câncer em mestátase incontrolável,
sendo os jovens rebeldes, indisciplinados e sem controle familiar seus
maiores alvos, e daí para a irresponsabilidade em todos os sentidos é
um passo.
Nesse cavalgar, portanto, o estado marginal está derrotando o estado
legal, pouco adiantando ministérios, secretarias, helicópteros,
carros, "caveirões", armas potentes ou aumento significativo do número
de policiais, já que o sentimento que nos toma, e não é de agora, é de
uma insegurança total e absoluta, impondo a todos nós que atuamos em
órgãos de defesa social como as Polícias, o Judiciário e o Ministério
Público, a fazer algo no sentido de mudar esse estado que aí está,
isso mesmo que uma lei nos diga que "não se pode colocar limites,
toques de acolher ou recolher, porque isso somente é
constitucionalmente possível em situações excepcionais, a exemplo do
"estado de calamidade".
Ora, desconhece calamidade pública maior do que esse estado de
insegurança que nos amedronta e torna refém a todos, porque as
calamidades causadas pela natureza, ou até por guerras, passam com o
tempo, mas esta, a da criminalidade, do tráfico desordenador, da
violência insuportável e preocupante só cresce, apesar das
estatísticas encomendadas dcriando em nosso subconsciente uma neurose
avassaladora que destrói até nosso equilíbrio psíquico?. Faz favor...
Por isso penso e ajo diferente, ora falando em queda de índice de
homicídios, assalto a ônibus, roubos de veículos, etc, e que não
convém a ninguém porque o dia a dia é o melhor retrato que se tem
disso tudo, e se para melhorar isso aí deve-se adotar medidas de
exceção como o "toque de acolher", que se adote, que se pratique, e se
deve praticar até porque os alvo dela não usaram com responsabilidade
a liberdade e o livre arbítrio.
Por isso sou a favor de fechamento de bares e restaurantes em
determinadas horário, bem como a limitação de circulação de jovens na
faixa etária até 18 anos, porque o limite da inimputabilidade
biológica, e porque são, estatisticamente, autores e vítimas da
maioria dos crimes contra a pessoa, contra a vida e contra o
patrimônio e contra os costumes.
E sou porque, lembrando a saudação feita pelo desembargador Manoel
Moreira à desembargadora Eleonora Cajahyba, quando esta se aposentou,
digo que "a vida só se faz pequena quando se adia em nós o que fazer
dela...". Temos que aprender, portanto, como no silogismo de Kelsen, a
entender que nem sempre o que é legal, é justo, competindo ao
aplicador do direito examinar o caso concreto com vistas sempre à
vulnerabilidade da lei, e ao aplicá-la na medida da sua justiça e do
seu convencimento moral, pode afastá-la como imprestável ao fim, ao
controle e ao remédio necessário e desejado para curar a doença social
que se lhe fora apresentada
Como bem lembrou o desembargador Antônio Pessoa, "a sociedade reclama
juízes vivos, não aqueles meros aplciadores de lei", concluindo que "o
uso automático e mecânico da lei agrada a tecnocratas, porque
defensores do uso da máquina que não pensa, dos números que não sentem
e da burocracia que não vê".
Um abraço.
Luiz Augusto de Santana/Promotor de Justiça
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