Vai a Júri magarafe que "abriu" amigo com várias facadas, por causa de uma moto, em Itapicuru-BA
A Justiça de Itapicuru-BA, a 225 km de Salvador-BA, sentenciou WEVERTON R. SANTOS, conhecido como “Wertinho”, que trabalhava como magarafe (açoguerio em matadouro), pela prática do crime previsto no art. 121, §2º, III, IV, do
Cód.Penal - homicídio duplamente qualificado por meio cruel e por pegar a vítima de surpresa.
O crime ocorreu no dia 29 de julho de
2012, por volta das 01:00h da manhã, no povoado Lagoa Redonda, Itapicuru-BA, na divisa com Tobias Barreto-SE, quando a vítima foi alvejada por diversos golpes de faca, porque tinha pegado uma moto do acusado emprestada e não a devolveu no prazo, além de tê-la danificado sem querer.
"A Vítima foi surpreendida com a chegada do Acusado em um
Bar, por volta de uma hora da manhã, exigindo a moto de volta. E, ao virar as
costas para o Acusado, este a golpeou pelas costas, tendo ainda tentado fugir e caiu,
sendo alcançada pelo acusado, que desferiu diversos golpes de arma branca,
por todo seu corpo, ocasião em que passou a 'abir' o tórax do vitimado,
produzindo corte que lhe expôs as vísceras”, disse a Acusação.
Testemunhas viram o acusado arrancando os órgãos do falecido com a faca e ainda arrancou uma tatuagem no braço, com a mesma faca, "abrindo"o falecido do pescoço até o intestino.O irmão da vítima disse que teve que recolocar os órgaos, como o intestino, de volta na barriga do morto.
A defesa alegou legítima defesa, contudo, não convenceu o Juiz José Brandão, titular da Comarca de Itapiciru-BA, determinando que réu fosse julgado pelo Júri popular, pelo crime de homicídio qualificado.
Por Clécia Rocha, colaboradora da Justiça
Eis a decisão:
"SENTENÇA
Narra
a denúncia, em síntese, que, no dia 29 de julho de
2012, por volta das 01:00h, no povoado Lagoa Redonda, a Vítima fora alvejada
por diversos golpes de faca, realizadas pelo acusado, W.R.S, mediante surpresa e por motivo fútil, vez que a vítima,
José Ronaldo, fora golpeada pelas costas, dificultando ou impossibilitando sua
defesa, bem como por ter provocado sua
morte por meio cruel.
A
motivação do fato, segundo a Acusação,
se deu pelo fato da Vítima ter pegado uma motocicleta emprestada pelo Acusado e
não tê-la devolvida imediatamente, além de tê-la danificada por ter caído
algumas vezes com a moto.
Ainda
segundo a Acusação, a Vítima fora surpreendida com a chegada do Acusado em um
Bar, por volta de uma hora da manhã, exigindo a moto de volta. E, ao virar as
costas para o Acusado, este a golpeou pelas costas, tendo ainda tentado fugir,
mas foi alcançado pelo acusado que desferiu diversos “golpes de arma branca,
por todo seu corpo, ocasião em que passou a abir o torax do vitimado,
produzindo um corte que lhe expôs as vísceras”, disse a Acusação.
Requer
que o réu seja pronunciado e submetido a Júri popular com sua condenação ao
final.
A
denúncia foi ofertada com lastro em inquérito policial, cujas peças principais
são: termos de declarações e interrogatório, fotografias de fls.12/14, e relatório
(fls. 28/29-verso), tendo o Delegado
enquadrado o Acusado como autor de homicídio duplamente qualificado. Prisão preventiva decretada em
05/09/2012 (fls.37)
Às
fls.56/58-verso, consta que o Réu foi preso no dia 20/02/2013, tendo sido
indeferido o pedido de liberdade provisória (fls.61/62). E, novamente, foi
indeferido novo pedido de liberdade provisória (fls. 72/73).
Realizada
audiência de instrução para oitiva das testemunhas de acusação, foram ouvidas 03 testemunhas de
acusação e as testemunhas de defesa, além do interrogatório do Réu (fls. 83 a
91)
Alegações
finais do MP, em audiência, aduzindo, em suma, que o réu confirmou que desferiu golpes de faca na vítima, alegando que estão claras a prova da
materialidade e os indícios veementes de autoria pelo crime de homicídio
qualificado por impossibilidade de defesa da Vítima, em razão da surpresa, pois
atacou-a pelas costas e por meio cruel, alegando que o Réu arrancou a tatuagem
da vítima e abriu o seu tórax, dando-lhe diversos golpes.
Requer
a pronúncia do réu para que ele seja julgado e condenado pelo Tribunal do Júri
nas sanções constantes do art. 121, §2º, III,
IV, do
CP, retirando a qualificativa do motivo fútil.
Já a defesa em suas alegações finais,
além de ter requerido a liberdade provisória, alegou, em suma, que o Réi agiu
em legítima defesa, insistindo na referida excludente da crimininalidade,
aduzindo, ainda, que o Réu é primário, menor de 21 anos e, por isso, requer sua
absolvição. (fls. 96/101).
É o relatório.
Passo a decidir.
Cuida-se
de ação penal movida pelo Ministério Público em face de W.R.S, qualificado nos autos, pela
prática do crime previsto no art. 121, §2º, III, IV, do CP, tendo como vítima J.R.
A peça acusatória atribui ao réu o crime de homicídio
duplamente qualificado.
Não há preliminares a serem apreciadas.
O
art. 413 do CPP estabelece que o juiz pronunciará o réu quando se convencer da
existência do delito e houver indícios de ele ser o autor, sendo vedado ao
julgador a análise aprofundada do mérito da questão, haja vista que tal
premissa, por imperativo constitucional, cabe aos integrantes do Conselho de
Sentença do Júri Popular.
Procedendo-se, portanto, a atenta análise dos autos,
verifica-se que a materialidade do delito está demonstrada pelo laudo de
exame cadavérico (fls. 93/95).
Assim, comprovada
materialidade do fato, passa-se à autoria.
No
que tange à autoria, a mesma foi descoberta, ante a
confissão do acusado na polícia e em juízo, onde relatou as circunstâncias em
que ocorreu a ação, porém, alega que agiu
em legítima defesa.
A
testemunha XXX, disse que
“QUE ligaram para o depoente,
dizendo que o seu irmão estava morto; QUE se dirigiu ao local e viu a vítima
esfaqueda e morta; Que as pessoas, no local, disseram que foi “Wertinho” quem
cometeu o fato; Que um adolescente de 15 anos disse que foi Wertinho o autor do
fato e isso aconteceu por caua de uma
moto, que deixou Wertinho com raiva; QUE soube que a vítima disse que o
conserto da moto seria feito pela “Coroa”; Que o acusado trabalha no
matadouro,cortando “BOI”; Que outra testmunha disse:“não mate não,
rapaz, deixe o cara!; Que esta disse que o acusado deu a facada depois que
a vítima deu as costas, tendo o acusado retirado com a faca uma tatuagem do
braço da vítima e deu mais facadas no pescoço até embaixo e até os órgãos
estavam expoStos e o Depoente ainda colocou os órgaõs expostos de volta no
corpo da vítima; Que ambos eram amigos, como se fossem irmãos...
Já
a segunda testemunha XXX disse que:
“que assistiu a morte da Vítima; que estava
bebendo no dia do fato com o finado no Bar defronte ao Hospital, por volta de
uma hora da manhã; que viu o dono da moto e falou para vítima e falou: olha o
dono da moto aí, tendo a vítima dito: deixa ele vir; que o Acusado se aproximou
da Vítima e perguntou: e o negócio da moto como é que vai ficar? ; que em
seguida, a Vítima disse que se ele não pagasse a avó pagaria, dando as costas
para o Acusado; que repentinamente, o Acusado investiu com uma facada nas
costas da Vítima; que a Vítima ainda correu em direção ao Hospital, mas não
aguentou diante da facada que recebeu, e caiu no meio do caminho; que ainda
assim, o Acusado se aproximou da Vítima no chão “e abriu o cara”; que o Acusado
neste momento, com a mesma faca, retirou uma tatuagem do braço esquerdo da
Vítima, não tendo mais visto se o Acusado deu outras facadas, pois quando o
Acusado deu a primeira facada, o depoente correu e ficou de longe olhando; que
a Vítima estava desarmada; que o Acusado tirou a faca de forma muito rápida e a
faca estava escondida no casaco que ele trajava; que a Vítima não estava
armada;
Consoante
as provas acima, há indícios de autoria do delito.
A
materialidade delitiva restou devidamente comprovada através das fotografias
(fls. 12/14), laudo de exame cadavérico,
(fls.94/95).
Para o tipo penal correspondente à ação do
acusado é o Tribunal do Júri o seu Juízo natural.
Quanto às qualificadoras previstas no art.
121, § 2º, III (meio cruel)e IV (mediante recurso que dificulte ou torne
impossível a defesa do ofendido) do Código Penal Brasileiro.
Sobre qualificadoras, somente as
manifestamente improcedentes devem ser extirpadas do crivo do Sodalício
Popular. Não é o caso em questão, sendo bastante observar o modus operandi e a motivação
atribuídos,conforme diz a denúncia . Neste sentido, a doutrina não diverge e a
jurisprudência é remansosa, especialmente no SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, verbi
gratia:
“a) AGRAVO REGIMENTAL.
RECURSO ESPECIAL. PROCESSO PENAL.
HOMICÍDIO.PRONÚNCIA. EXCLUSÃO DE
QUALIFICADORA. VALORAÇÃO DAS PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. COMPETÊNCIA DO
TRIBUNAL DO JÚRI.1. A exclusão de
qualificadoras, na pronúncia, somente pode ocorrer quando se verificar, de plano, sua improcedência, sendo
vedado nessa fase valorar as provas para afastar a imputação concretamente
apresentada pela acusação, sob pena de
se usurpar a competência do juiz natural da causa, o Tribunal do Júri.(...)
(...)
3 - A exclusão das qualificadoras, na pronúncia, somente pode ocorrer quando se
verificar, de plano, sua
improcedência, o que não se reconhece na
espécie. É vedado, nessa fase, valorar as provas para afastar a imputação
concretamente apresentada pela acusação, sob pena de se usurpar a competência do juiz natural da causa, o Tribunal
do Júri.”
As
referidas qualificadoras devem ser submetidas ao Tribunal do Júri. Limito-me a
não tecer maiores comentários nem digressões acerca das mesmas, a fim de não
influenciar, indevidamente, na soberana decisão dos Srs. Jurados componentes do
Conselho de Sentença.
Enfim,
analisando as provas trazidas aos autos, não vislumbro, a princípio, nenhuma
circunstância extreme de dúvida que exclua a antijuridicidade do fato.
Ressalte-se que, “como juízo de
admissibilidade, não é necessário à Pronúncia que exista a certeza que se exige
para a condenação. Daí que não vige o princípio do in dubio pro reo, mas
se resolvem em favor da sociedade as eventuais incertezas propiciadas pela
prova, ou seja, in dubio pro societate”. (Tristão, Adalto em Sentença
Criminal, 6ª Edição, Editora Del Rey, pg.261).
Pelo exposto, com fundamento no art. 413 do Código de
Processo Penal, tenho por PRONUNCIAR o réu WRS, “Wertinho”,
qualificado nos autos, pela prática do crime previsto no art. 121, §2º, III (meio cruel) e IV (mediante recurso que
dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido), do Código Penal, para
que seja submetido a julgamento pelos seus pares, pelos fundamentos acima
aduzidos.
Tendo em vista
que os réu foi pronunciado e a instrução já se encerrou, não há motivos
plausíveis para o(s) mesmo(s) respondere(m) ao processo em liberdade, uma vez
que acabou de ser pronunciado(s) e seria contraditório, após a pronúncia,
respondendo ao processo preso(s), ter restituída(s) sua(s) liberdade(s), até
porque mister se faz que seja garantida a ordem pública em razão dos
pressupostos da prisão preventiva, nos termos do art. 312, CPP, diante do modus
operandi como o fato foi praticado.
PRI
ITAPICURU/BA,
maio de 2013"
JUIZ DE DIREITO
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