Se o STF condenar um parlamentar federal e decidir que ele deverá perder o cargo, isso ainda dependerá de uma deliberação da Câmara dos Deputados ou do Senado?
?
segunda-feira, 5 de junho de 2017
O Código Penal prevê que a pessoa
condenada criminalmente perderá o cargo, função pública ou mandato eletivo que
ocupe nos seguintes casos:
Art. 92. São também efeitos da
condenação:
I – a perda de cargo, função pública ou
mandato eletivo:
a) quando aplicada pena privativa de
liberdade por tempo igual ou superior a um ano, nos crimes praticados com abuso
de poder ou violação de dever para com a Administração Pública;
b) quando for aplicada pena privativa
de liberdade por tempo superior a 4 (quatro) anos nos demais casos.
Ex: se um Prefeito é condenado
criminalmente a 2 anos de detenção pela prática de um crime contra a
Administração Pública, no próprio acórdão já deverá constar a determinação,
fundamentada, de que ele perderá o mandato eletivo.
Vale ressaltar que, para Prefeito, por
exemplo, não é necessária nenhuma outra providência adicional além da
determinação na decisão condenatória.
Assim, em caso de condenação criminal
transitada em julgado, haverá a perda imediata do mandato eletivo no caso de
Vereadores, Prefeitos, Governadores e Presidente da República.
Além da previsão expressa no Código
Penal, a perda do mandato eletivo encontra justificativa na CF/88. Isso porque,
para a pessoa exercer um mandato eletivo, ela precisa estar no pleno gozo de
seus direitos políticos, e o indivíduo condenado criminalmente fica com seus
direitos políticos suspensos enquanto durarem os efeitos da condenação. Tal
conclusão está prevista expressamente no art. 15, III c/c art. 14, § 3º, II da
CF/88:
Art. 15. É vedada a cassação de
direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de:
III – condenação criminal transitada em
julgado, enquanto durarem seus efeitos;
Art. 14 (...)
§ 3º São condições de elegibilidade, na
forma da lei:
II – o pleno exercício dos direitos
políticos;
A grande controvérsia reside no caso de
condenação criminal de Deputados Federais e Senadores. A discussão jurídica é a
seguinte: a condenação criminal transitada em julgado é suficiente, por si só,
para acarretar a perda do mandato eletivo de Deputado Federal ou de Senador? Se
o STF condenar um parlamentar federal e decidir que ele deverá perder o cargo,
isso acontece imediatamente ou depende de uma deliberação da Câmara dos
Deputados ou do Senado Federal, respectivamente?
Existem três correntes principais a
respeito do tema:
1ª
corrente: mesmo com a condenação criminal, quem decide se haverá a perda do
mandato é a Câmara dos Deputados ou o Senado Federal.
Para a
primeira corrente, a regra do art. 15, III, da CF/88 não se aplica a Deputados
Federais e Senadores. Isto porque no caso desses parlamentares há uma norma
específica que excepciona a regra geral. Trata-se do art. 55, VI e § 2º da
CF/88, que afirma expressamente que a perda do cargo é decidida pela respectiva
Casa legislativa. Confira:
Art. 55. Perderá o mandato o Deputado
ou Senador:
VI – que sofrer condenação criminal em
sentença transitada em julgado.
(...)
§ 2º Nos casos dos incisos I, II e VI, a perda do mandato será DECIDIDA pela Câmara dos
Deputados ou pelo Senado Federal, por maioria absoluta, mediante
provocação da respectiva Mesa ou de partido político representado no Congresso
Nacional, assegurada ampla defesa
Logo, para esta primeira corrente,
mesmo o Deputado Federal ou o Senador tendo sido condenado criminalmente, com
sentença judicial transitada em julgado, ele somente perderá o mandato se assim
DECIDIR a maioria absoluta da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal.
O STF adotou esta corrente no
julgamento do Senador Ivo Cassol (AP 565/RO, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em
7 e 8/8/2013) (Info 714).
2ª
corrente: se o STF condenar o parlamentar e determinar a perda do mandato, a
Câmara ou o Senado não mais irá decidir nada e deverá apenas formalizar (cumprir)
a perda que já foi decretada.
Para a segunda corrente, o § 2º do art.
55 da CF/88 não precisa ser aplicado em todos os casos nos quais o Deputado ou
Senador tenha sido condenado criminalmente, mas apenas nas hipóteses em que a
decisão condenatória não tenha decretado a perda do mandato parlamentar por não
estarem presentes os requisitos legais do art. 92, I, do CP ou se foi proferida
anteriormente à expedição do diploma, com o trânsito em julgado em momento
posterior.
Em outras palavras:
• Se na decisão condenatória o STF não
determinou a perda do mandato eletivo, nos termos do art. 92, I, do CP: a perda
do mandato somente poderá ocorrer se a maioria absoluta da Câmara ou do Senado
assim votar (aplica-se o art. 55, § 2º da CF/88);
• Se na decisão condenatória o STF
determinou a perda do mandato eletivo, nos termos do art. 92, I, do CP: a perda
do mandato ocorrerá sem necessidade de votação pela Câmara ou Senado (não se
aplica o art. 55, § 2º).
O procedimento estabelecido no art. 55
da CF disciplina circunstâncias em que a perda de mandato eletivo parlamentar
pode ser decretada com base em juízo político. No entanto, esse procedimento
não é aplicável quando a aludida perda foi determinada em decisão do Poder
Judiciário como efeito irreversível da sentença condenatória.
Em outras palavras, se o STF determinou
a perda do cargo, a Casa Legislativa deverá simplesmente cumprir a decisão. Se
o STF não determinou a perda do cargo, mesmo assim a Casa Legislativa pode
entender que não é correto manter um Deputado ou Senador com mandato quando ele
tiver sido condenado e decidir pela perda do cargo, com base no art. 55, § 2º,
da CF/88.
Logo, para esta segunda corrente, se o
Deputado Federal ou o Senador foi condenado criminalmente, com sentença
judicial transitada em julgado, o STF poderá determinar a perda do mandato
eletivo, nos termos do art. 92, I, do CP. Nessa hipótese, não será necessária
votação pela respectiva Casa (não se aplica o art. 55, § 2º da CF/88). A
condenação já tem o condão de acarretar a perda do mandato.
O STF já adotou esta corrente no
julgamento do “Mensalão” (AP 470/MG, Rel. Min. Joaquim Barbosa, julgado em 10 e
13/12/2012) (Info 692).
3ª corrente: depende.
•
Se o Deputado ou Senador for condenado a mais de 120 dias em regime fechado: a
perda do cargo será uma consequência lógica da condenação. Neste caso, caberá à
Mesa da Câmara ou do Senado apenas declarar que houve a perda (sem poder
discordar da decisão do STF), nos termos do art. 55, III e § 3º da CF/88.
•
Se o Deputado ou Senador for condenado a uma pena em regime aberto ou
semiaberto: a condenação criminal não gera a perda automática do cargo. O
Plenário da Câmara ou do Senado irá deliberar, nos termos do art. 55, § 2º, se
o condenado deverá ou não perder o mandato.
STF. 1ª Turma. AP 694/MT, Rel. Min.
Rosa Weber, julgado em 2/5/2017 (Info 863).
Se o Deputado ou Senador for
condenado a mais de 120 dias em regime fechado, ele deverá cumprir a pena em
penitenciária e não poderá sair para trabalho externo. Logo, não poderá
frequentar o Congresso Nacional, devendo, por consequência, perder o mandato
com base no art. 55, III, da CF/88:
Art. 55. Perderá o mandato o Deputado
ou Senador:
(...)
III - que deixar de comparecer, em
cada sessão legislativa, à terça parte das sessões ordinárias da Casa a que
pertencer, salvo licença ou missão por esta autorizada;
Esse inciso III prevê a perda do
mandato ao parlamentar que, em cada sessão legislativa, faltar a 1/3 das
sessões ordinárias. Como a sessão legislativa é anual (equivalente a 1 ano),
1/3 significa 4 meses (120 dias). Logo, se o parlamentar irá ficar preso
durante mais de 120 dias, ele não poderá comparecer às sessões neste período e,
portanto, deverá ser declarada a perda de seu mandato.
No caso deste inciso III, a perda
do mandado é DECLARADA pela Mesa Diretora da Câmara ou do Senado:
Art. 55 (...)
§ 3º - Nos casos previstos nos incisos
III a V, a perda será declarada pela Mesa da Casa respectiva, de ofício ou
mediante provocação de qualquer de seus membros, ou de partido político
representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa.
Declaração não é o mesmo que
deliberação (decisão). Assim, ocorrendo a situação descrita no inciso III do
art. 55, a Mesa da Casa respectiva não tem o poder de decidir se o Parlamentar
irá perder ou não o mandato. A Mesa é obrigada a simplesmente declarar
(reconhecer, formalizar) que o Parlamentar perdeu o mandato.
Assim, no caso do inciso III, não
há necessidade de deliberação do Plenário e a perda do mandato deve ser
automaticamente declarada pela Mesa Diretora da Câmara dos Deputados.
Por que se o parlamentar for
condenado ao regime semiaberto ou aberto ele não perderá automaticamente o
cargo?
Porque nos casos de condenação em
regime inicial aberto ou semiaberto, há a possibilidade de autorização de
trabalho externo. Logo, em tese, ele poderia ser um presidiário que sai para
trabalhar como parlamentar durante o dia e volta para o presídio à noite.
Qual é a posição que devo adotar
em concursos?
O tema ainda não está pacificado
no STF. No entanto, para fins de concurso, penso que se deve adotar a 3ª corrente
porque se trata do julgado mais recente.
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