Por José Brandão Netto*


              
                 Entrou em vigor, no dia 23 de janeiro/20, em todo o país, a Lei nº 13.964/19, que trata do pacote anticrime. A criação do juiz de garantias, previsto no art. 3-A ao art.3° -F do CPP, foi suspensa pelo STF.

             A lei alterou 12 artigos do Código Penal, modificou mais de 26 artigos do CPP e promoveu diversas alterações na legislação penal e processual penal esparsa. 

               Dentre as inovações, foi introduzido o Acordo de Não Persecução Penal -ANPP no art. 28-A da novel Lei.

             Eis  parte artigo que trouxe a novidade e que trata do tema que nos interessa:

Art. 28-A. Não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos, o Ministério Público poderá propor acordo de não persecução penal, desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime , mediante as seguintes condições ajustadas cumulativa e alternativamente:

I - reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, exceto na impossibilidade de fazê-lo;

II - renunciar voluntariamente a bens e direitos indicados pelo  Ministério Público como instrumentos, produto ou proveito do crime;

III - prestar serviço à comunidade ou a entidades públicas por período correspondente à pena mínima cominada ao delito diminuída de um a dois terços, em local a ser indicado pelo juízo da execução, na forma do art. 46 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal);

IV - pagar prestação pecuniária, a ser estipulada nos termos do art. 45 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), a entidade pública ou de interesse social, a ser indicada pelo juízo da execução, que tenha, preferencialmente, como função proteger bens jurídicos iguais ou semelhantes aos aparentemente lesados pelo delito; ou

V - cumprir, por prazo determinado, outra condição indicada pelo Ministério Público, desde que proporcional e compatível com a infração penal imputada.

(...)



           
            Grande fator para a aprovação da novidade é que os casos que chegam às varas criminais têm tramitação morosa e sofrem com infindável nº de incidentes e burocracias, sendo que tais processos acabam não sendo julgados, no tempo necessário, o que ocasiona prescrição e gera impunidade, afirma o promotor de Justiça  Rodrigo Leite Ferreira Cabral, no livro "Projeto de Lei anticrime, pag. 499, Editora Juspodium.
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           Daí porque, uma das soluções para este último problema e se pensar numa modelo de acordo criminal
           Haverá economia de recursos públicos, intervenção menos traumática do Estado para este tipo de delito

       
         Na Alemanha e na França, tem-se buscado uma Justiça penal negociada.

           Foi, por isso, que, diante da necessidade de se buscar soluções céleres e efetivas, foi i publicada a mencionada Lei, que teve por base o texto da Resolução nº 181 do Conselho Nacional do Ministério Público -CNMP, ou seja, o mencionado acordo não é uma novidade normativa no ordenamento brasileiro.


REQUISITOS DO ACORDO DE NÃO PERSECUÇAO PENAL-ANPP

Os requisitos do acordo de não persecução penal estão no caput do art. 28-A, acima citado, são os seguintes:

1- aparência de prática criminosa( fumus comissi delicti

2- infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 anos, considerando as causas de aumento de pena;

3- confissão circunstanciada do investigado



                    IMPEDIMENTOS PARA  Acordo de Não Persecução Penal 



               Existem situações que impedem de o investigado fazer jus ao benefício. Ei-las:

- se for cabível transação penal de competência dos Juizados Especiais Criminais, nos termos da lei;

- se o investigado for reincidente ou se houver elementos probatórios que indiquem conduta criminal habitual, reiterada ou profissional, exceto se insignificantes as infrações penais pretéritas;


-ter sido o agente beneficiado nos 5 (cinco) anos anteriores ao cometimento da infração, em acordo de não persecução penal, transação penal ou suspensão condicional do processo e

- nos crimes praticados no âmbito de violência doméstica ou familiar, ou praticados contra a mulher por razões da condição de sexo feminino, em favor do agressor.



            CONDIÇÕES PARA ACORDO DE NÃO PERSECUÇAO PENAL-ANPP

Após verificarmos os requisitos e impedimentos para o suposto infrator fazer jus ao benefício do acordo de não persecução penal, a lei ainda prevê algumas condições obrigatórias para o benefício ser conseguido. Elas são as seguintes:

I - reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, exceto na impossibilidade de fazê-lo;

II - renunciar voluntariamente a bens e direitos indicados pelo Ministério Público como instrumentos, produto ou proveito do crime;

III - prestar serviço à comunidade ou a entidades públicas por período correspondente à pena mínima cominada ao delito diminuída de um a dois terços, em local a ser indicado pelo juízo da execução, na forma do art. 46 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal);

IV - pagar prestação pecuniária, a ser estipulada nos termos do art. 45 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), a entidade pública ou de interesse social, a ser indicada pelo juízo da execução, que tenha, preferencialmente, como função proteger bens jurídicos iguais ou semelhantes aos aparentemente lesados pelo delito; ou

V - cumprir, por prazo determinado, outra condição indicada pelo Ministério Público, desde que proporcional e compatível com a infração penal imputada.



       QUAIS CRIMES PODERÃO SER SUBMETIDOS AO ANPP? 

          O acordo de não persecução terá grande aplicação, pois rol de crimes que têm pena mínima inferior a 04 anos, sem violência ou grave ameaça, é extenso. 
           Mas se pena máxima for até  2 anos, aplicar-se-á a transação penal, hipótese que afasta a aplicação do referido ANPP de que estamos tratando.

           Então, nos crimes cuja pena mínima seja inferior a 4 anos, presentes os demais requisitos e não havendo hipóteses de impedimento legal para ao acordo, o representante do MP deverá propor o mencionado o referido.
          

Há que se lembrar dos  § 1º dio art. 28 -A do CPP, incluído pela Lei nº 13.964, de 2019, segundo o qual,  para aferição da pena mínima cominada ao delito a que se refere o caput do novel artigo 28-A , serão consideradas as causas de aumento e diminuição aplicáveis ao caso concreto.  
          Apenas para citar alguns exemplos, seguem alguns delitos, no âmbito do Código Penal e legislação esparsa, para o qual será aplicável o novel instituto:

- abandono de incapaz- art. 133 do CP

- exposição ou abandono de recém-nascido- art. 134 do CP

- sequestro ou cárcere privado- art. 148 do CP

- Invasão de dispositivo informático - art. 154

  Apropriação indébita- art., 168

- furto simples- art. 155, caput do CP


- furto qualificado- furto qualificado

- violação telegráfica – art. Art.151, §1º, do CP

- extorsão indireta- art. 160 do CP

-supressão de marcas em animais- art. 162 do CP

- dano e dano qualificado- art. 163 do CP

- estelionato-art.171 do CP

- induzimento à especulação- art. 174 do CP

- aliciamento de trabalhadores para outro local- art. 207 do CP

- aliciamento para fins de imigração – art. 206 do CP

- Todos os crime CONTRA O SENTIMENTO e contra  O RESPEITO AOS MORTOS- art. 208 do CP e ss 

- Boa parte dos crimes contra a dignidade sexual, dês que não haja violência/grave ameaça e a pena mínima seja inferior a 4 anos, como mediação para servir à lascívia de outrem- art 227 do CP, importunação ofensiva ao pudoor

- Associação Criminosa- art. 288 do CP

- Simulação de autoridade para celebrar casamento- art. 239 do do CP

- Perigo de inundação – art. 255, do CP

-Interrupção ou perturbação de serviço telegráfico, telefônico, informático, telemático ou de informação de utilidade pública   -266, do CP

- Moeda falsa- art. 289 do CP

  • Falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais na modalidade culposa- art. 273, §2º, do CP.

    - falsificação de documento de documento público ou particular- art. 297/298 do CP

    - Fraudes em certames de interesse público  - Art. 311-A do CP.

  • - peculato - art. 312 do CP]


  • - corrupção- art. 317 do CP


  • - corrupção ativa- art. 333 do CP


  • - descaminho - art. 334 do CP


    - contrabando - art.334-A do CP

  • - Denunciação caluniosa- art. 339 do CP;

  • - Quase a totalidade de crimes eleitorais: art. – Código Eleitoral Lei 4.737/65- salvo art. 302 do CE, art. 72 da Lei 9504/97 e Transporte ilegal de Eleitores- art. 11,III, DA LEI 6.091/74 

- posse e porte de arma- art. 12 e 14 da lei 10.826/03- Estatuto do Desarmamento


              Quanto ao  tráfico de drogas, com causa de redução de pena, há quem poderá pensar que seria mais um tipo penal que acabaria sendo objeto do ANPP, porque a pena mínima, para tráfico de drogas, é 05 anos e, quando há redução do § 4º do art.33 da Lei 11.343/06 , poderia ficar aquém de 4 anos. 
     
             O  § 4º do art.33 da Lei 11.343/06 afirma que: "Nos delitos definidos no caput e no § 1º deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços (...), desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa".

                 Assim, em razão da condição individual (primário e  de bons antecedentes), bem como em razão da seu comportamento social (não se dedicar a atividades criminosas, nem integre organização criminosa), o agente  poderia ter, em princípio, direito ao benefício.

                No entanto, isso dependerá muito da postura do representante do MP que, caso não tenha elementos suficientes para aferir a existência dos requisitos para a redução de pena prevista no § 4º da Lei 11.343/06,  acabará oferecendo a denúncia e não proporá o ANPP, pois se fará mister o curso da ação penal, em regra, para aferir os requisitos acima citados, o que, em princípio, obstará a aplicação do benefício. Isso inclusive decorre do tratamento constitucional  e da lei penal que, abstratamente, são rigorosos na repressão contra o tráfico de drogas.

               CONCLUSÃO

               Para finalizar, o acordo de não persecução penal será formalizado por escrito e será firmado pelo membro do Ministério Público, pelo investigado e por seu defensor.
              Para a homologação do acordo de não persecução penal, será realizada audiência na qual o juiz deverá verificar a sua voluntariedade, por meio da oitiva do investigado na presença do seu defensor, e sua legalidade.
             Descumpridas quaisquer das condições estipuladas no acordo de não persecução penal, o Ministério Público deverá comunicar ao juízo, para fins de sua rescisão e posterior oferecimento de denúncia.  

A celebração e o cumprimento do acordo de não persecução penal não constarão de certidão de antecedentes criminais, exceto para os fins previstos no inciso III do § 2º do art.28 -A do CPP.

Segundo § 13 do novel art. 28-A do CPP, cumprido integralmente o acordo de não persecução penal, o juízo competente decretará a extinção de punibilidade.

No caso de recusa, por parte do Ministério Público, em propor o acordo de não persecução penal, o investigado poderá requerer a remessa dos autos a órgão superior da instituição.



*José Brandão Netto é Juiz de Direito na Bahia. 
Mestrando em Direito/UFBA

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