TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTAO DA BAHIA
Réu: XXXXXX


DECISÃO

Trata-se de pedido de revogação de prisão preventiva- fls.77;90 em favor de XXXXX. Justifica seu pedido alegando que corre risco de ser contaminado pela PANDEMIA DO COVID -19 .
Requer prisão domiciliar por conta da pandemia do Covid-19.
A representante do Ministério Público opinou pela denegação, pois sem haver alteração fática, em face da característica rebus sic stantibus da prisão cautelar, não há como deferir o pleito, alegando que a Portaria do MJ fala das formas como lidar em contaminação de COVID-19 em presídios e a referida Portaria não autoriza liberdade em massa de presos.



Nas fls. 60/61, xxxxx  juntou instrumento de mandato ( procuração), assinada pelo, réu, ou seja revogou tacitamente o mandato anterior.



A figura da revogação tácita do mandato ocorre quando outro advogado sobrepõe nos autos procuração outorgada pelo mesmo cliente. O novo mandato então revoga o anteriormente dado, automaticamente.



Embora não se deva aceitar procuração de quem já tenha advogado constituído, a revogação tácita pode ocorrer por motivo justo ou para adoção de medidas judiciais urgentes e inadiáveis. Sobre o tema, assim se manifesta a jurisprudência:

TJ-SP - Agravo de Instrumento AG 990092560646 SP (TJ-SP) Jurisprudência•Data de publicação: 10/03/2010 -EMENTA ADVOGADO - INTIMAÇÃO - ALEGAÇÃO DE CONSTITUIÇÃO DE NOVO MANDATÁRIO -REVOGAÇÃO TÁCITA DA PROCURAÇÃO ANTERIORMENTE OUTORGADA - ALEGAÇÃO DE NULIDADE DOS ATOS PROCESSUAIS -OCORRÊNCIA. A apresentação de nova procuração implica a renúncia tácita aos advogados anteriormente constituídos. Logo, a intimação deve se dar no nome dos atuais patronos da parte. (….)

Assim, considera-se revogado o mandato do 1º advogado  XXXX, devendo o cartório fazer as intimações em nome do atual patronos da parte, o dr XXXX



No mérito, o Juízo converteu sua prisão em flagrante em prisão preventiva em 09-12-19, quando foi recebida a denúncia e, menos de 10 dias depois, defesa requereu a revogação da prisão sem trazer nenhum fato novo.



O MP deu parecer e o juiz indeferiu o pedido de revogação da prisão preventiva -fls. 57.





(xxxxx)



A questão relativa ao COVID-19 tem sido alegada de forma tão indiscriminada que sequer mereceria análise detalhada.



A situação da pandemia de coronavírus e da Recomendação nº 62/20 no CNJ, além de se tratar, no caso concreto, em tese, de crime hediondo, segundo a novel Lei 13.979/20 e Portaria Nº 356 do Ministério da Saúde, para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus, poderão ser adotadas, entre outras, as seguintes medidas: I – isolamento ou II – quarentena.



Assim, não é razoável que presos provisórios ou não, acusados de crimes violentos ou ou com grave ameaça à pessoa, sejam colocados em liberdade de forma irrestrita. 



Ao contrário, há orientação, no presente momento, para restringir a circulação de pessoas, com isolamento social. 



Liberar, indiscriminadamente, quem está preso vai de encontros à à orientação da Lei 13.979/20 e Portaria Nº 356 do Ministério da Saúde, inclusive manter pessoas presas por crime violento ou com grave ameaça à pessoa atende ao quanto na Recomendação Nº 62/2020 do CNJ, no seu art. 4º,I, c, numa interpretação, “ a contrario sensu”, verbis:

Art. 4° Recomendar aos magistrados com competência para a fase de conhecimento criminal que, com vistas à redução dos riscos epidemiológicos e em observância ao contexto local de disseminação do vírus, considerem as seguintes:
I — a reavaliação das prisões provisórias, nos termos do art. 316, do Processo Penal, priorizando-se:
(…)
c- prisões preventivas que tenham excedido o prazo de 90 (noventa) dias ou que estejam relacionadas a crimes praticados sem violência ou grave ameaça à pessoa




Ademais, quando o STF foi chamado para decidir, na ADPF 347, foi rejeitado voto do Ministro Marco Aurélio.No Plenário da corte, prevaleceu o voto divergente do ministro Alexandre de Moraes. Segundo ele, referendar a decisão do ministro Marco Aurélio significaria a determinação de uma megaoperação dos juízes de execução, numa espécie de mutirão carcerário. 



Como dito pelo Ministro, a Recomendação 62/2020 do Conselho Nacional de Justiça, ´de de cunho administrativo.



O Plenário da Corte rejeitou recomendações do ministro Marco Aurélio, que conclamava juízes a analisar alternativas à prisão aos que estão no grupo de risco do coronavírus. Prevaleceu que a Portaria do Ministério da Saúde, em conjunto com o Ministério da Justiça e Segurança Pública, e a Recomendação do CNJ já seriam suficientes para evitar a contaminação dos presos. 



Eis a Portaria em conjunto do Mj e MS:


PORTARIA INTERMINISTERIAL Nº 7, DE 18 DE MARÇO DE 2020
Dispõe sobre as medidas de enfrentamento da emergência de saúde pública previstas na Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, no âmbito do Sistema Prisional.
OS MINISTROS DE ESTADO DA JUSTIÇA E SEGURANÇA PÚBLICA E DA SAÚDE, no exercício de suas atribuições, previstas no inciso I do parágrafo único do art. 87 da Constituição e nos arts. 47 e 37 da Lei nº 13.844, de 18 de junho de 2019,(...) resolvem:
Art. 1º Esta Portaria dispõe sobre as medidas de enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus (covid-19), nos termos da Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, no âmbito do Sistema Prisional.
Parágrafo único. As normas e orientações do Ministério da Saúde acerca das medidas de enfrentamento da emergência de saúde pública decorrentes do covid-19 deverão ser seguidas no âmbito do sistema prisional.
Art. 2º A Administração Penitenciária deverá identificar os custodiados que apresentem sinais e sintomas gripais, inclusive por meio do incentivo à informação voluntária dos próprios custodiados.
  • 1º Os profissionais de saúde que atuam nos estabelecimentos prisionais deverão adotar procedimentos para averiguação e identificação de casos suspeitos, inclusive por meio de questionamentos sobre os sinais e sintomas gripais, independentemente do motivo inicial do atendimento.
  • 2º No ingresso de custodiado no estabelecimento prisional, deverão ser adotados procedimentos para identificação de casos suspeitos, inclusive por meio de questionamentos sobre os sinais e sintomas gripais, devendo ser observadas as medidas previstas no art. 3º.
  • 3º Os profissionais de saúde que atuam nos estabelecimentos prisionais deverão priorizar a identificação e o monitoramento da saúde de custodiados nos seguintes grupos de risco:
I – pessoas acima de 60 (sessenta) anos;
II – pessoas com doenças crônicas ou respiratórias, como pneumopatia, tuberculose, cardiovasculopatia, nefropatia, hepatopatia, doença hematológica, distúrbio metabólico (incluindo diabetes mellitus), transtorno neurológico que possa afetar a função respiratória, imunossupressão associada a medicamentos, como neoplasia, HIV/aids e outros;
III – pessoas com obesidade (especialmente com IMC igual ou superior a 40);
IV – grávidas em qualquer idade gestacional; e
V – puérperas até duas semanas após o parto.
  • 4º Além dos casos previstos no § 3º, os profissionais de saúde deverão priorizar a identificação e o monitoramento de crianças que estejam abrigadas em estabelecimentos prisionais.
Art. 3º Na hipótese de identificação de casos suspeitos ou confirmados entre os custodiados, os profissionais de saúde que atuam nos estabelecimentos prisionais deverão seguir as orientações previstas nesta Portaria e em atos do Ministério da Saúde, inclusive quanto ao uso de máscara e isolamento individual.
  • 1º Caso não seja possível o isolamento em cela individual dos casos suspeitos ou confirmados, recomenda-se à Administração Penitenciária adotar o isolamento por coorte e o uso de cortinas ou marcações no chão para a delimitação de distância mínima de dois metros entre os custodiados.
  • 2º Os espaços de isolamento deverão, sempre que possível:
I – conter porta fechada e ventilação;
II – disponibilizar suprimentos para a realização de etiqueta respiratória; e
III – propiciar meios para higienização constante das mãos, inclusive com água corrente e sabão.
  • 3º Os profissionais de saúde que realizarem atividades de triagem e de acompanhamento de custodiados em isolamento deverão evitar, se possível, a circulação e o atendimento nas alas sem casos suspeitos ou confirmados.
  • 4º Os casos suspeitos ou confirmados deverão ser monitorados pelos profissionais de saúde com o objetivo de identificar precocemente sinais de agravamento da doença.
  • 5º Os casos graves, especialmente os que apresentem Síndrome Respiratória Aguda Grave – SRAG, deverão ser encaminhados para o hospital de referência, nos termos do Plano de Contingência local, acaso existente.
  • 6º Os casos suspeitos ou confirmados de covid-19 entre os custodiados serão notificados, conforme orientação do Ministério da Saúde.
Art. 4º A Administração Penitenciária, observadas as orientações do Ministério da Saúde, deverá adotar medidas para identificação de sinais e sintomas gripais na porta de entrada dos estabelecimentos prisionais e suspensão da entrada de pessoas que apresentarem tais sintomas.
Parágrafo único. O disposto no caput aplica-se para quaisquer pessoas que objetivem ingressar no estabelecimento prisional, como visitantes, advogados, servidores, voluntários, profissionais de saúde, terceirizados e outros colaboradores.
Art. 5º A Administração Penitenciária deverá avaliar a adoção de medidas para o afastamento das atividades laborais de servidores, profissionais de saúde, terceirizados e outros colaboradores em caso de sinais ou sintomas gripais, e orientar sobre a necessidade de atendimento médico, preferencialmente em uma unidade da Atenção Primária à Saúde, como Unidade Básica de Saúde (UBS) ou Unidade de Saúde da Família (USF).
  • 1º A Administração Penitenciária deverá avaliar a adoção de medidas para o afastamento das atividades laborais de servidores, profissionais de saúde, terceirizados e outros colaboradores que:
I – regressaram de viagem do exterior, nos termos das orientações do Ministério da Saúde;
II – tenham idade acima de 60 (sessenta) anos;
III – sejam portadores de doenças crônicas ou respiratórias; ou
IV – estejam grávidas.
  • 2º Na hipótese de afastamento de trabalhadores sintomáticos, a Administração Penitenciária deverá adotar medidas para assegurar a preservação, o funcionamento e a continuidade dos serviços do estabelecimento prisional.
Art. 6º A Administração Penitenciária, considerando a situação epidemiológica relativa ao covid-19 no estabelecimento prisional, no ente federativo e no Brasil, deverá avaliar a adoção temporária de:
I – redução do número de visitantes permitidos ou da suspensão total das visitas; e
II – redução ou suspensão do acesso de pessoas externas que não se enquadrem na condição de visitantes, como grupos de auxílio espiritual e outros voluntários.
Parágrafo único. Em Estados com confirmação de caso de covid-19, a Administração Penitenciária deverá avaliar a proibição de entrada de visitantes:
I – acima de 60 (sessenta) anos;
II – com doenças crônicas ou respiratórias;
III – gestantes; ou
IV – crianças menores de cinco anos.
(….)
Art. 8º A Administração Penitenciária, observadas as orientações do Ministério da Saúde e as contidas nesta Portaria, deverá avaliar a adoção de medidas para informar, conscientizar e orientar sobre a prevenção e o enfrentamento do covid19 dentro do estabelecimento prisional, inclusive quanto:
I – às ações de profilaxia específicas para os custodiados, visitantes, servidores, profissionais de saúde e demais profissionais que atuem nos estabelecimentos prisionais; e
II – às mudanças na rotina do estabelecimento prisional.
Parágrafo único. Poderão ser disponibilizados, na entrada dos estabelecimentos prisionais e em locais estratégicos dessas unidades, alertas visuais (cartazes, placas ou pôsteres) com informações sobre a prevenção e o enfrentamento do covid-19.
Art. 9º Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.SERGIO MOROMinistro de Estado da Justiça e Segurança PúblicaLUIZ HENRIQUE MANDETTAMinistro de Estado da Saúde

Como visto, não, há na Portaria supra , nem na Recomendação nº 62 do CNJ, orientação para libertação de preso ou substituição por prisão domiciliar.



Por isso, revelam-se inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão, estando, portanto, a decisão motivada em receio de perigo e existência concreta de fatos novos ou contemporâneos que justificam a aplicação da medida adotada. (conforme art. 312, §2º, do CPP ) .



Por fim, conforme art. 312 do CPP, a prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria e de perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado.       (Redação dada pela Lei nº 13.964, de 2019)



Está evidente que há “receio de perigo e existência concreta de fatos novos ou contemporâneos que justificam a aplicação da medida adotada” (art. 312, §2°, do CPP), pois se trata de uma vítima de 12 anos de idade, em contexto de suposto XXXX, com alguém que tinha relação com a vítima, havendo, ainda, informações de ameaças praticadas pelo réu contra a mãe da vítima.



ASSIM, teoricamente, presentes a) prova da existência do crime (materialidade); b) indícios suficientes de autoria + “c”) elemento variável (periculum libertatis), no caso a garantia da ordem pública, fica indeferido o PEDIDO DA DEFESA, POIS não há mudança no cenário fático para a revogação da medida.
(....)


Dê-se ciência da presente ao ilustre representante do Ministério Público.



XXXx-BA, 

JUIZ 


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