DECISÃO


Cuidam os autos de ação anulatória de cassação de Carteira Nacional de Habilitação - CNH, cumulada com pedido de tutela de urgência ajuizada por ________ em face do DEPARTAMENTO ESTADUAL DE TRÂNSITO - DETRAN, com pedido de gratuidade de justiça.

 Relata o requerente, em síntese: 

"que em decorrência de multas aplicada em 15/12/2018, sem nunca ser notificado, nem auto de infração; que para sua surpresa no dia 07/11/2023 ao dirige-se ao DETRAN /BA para renovação da sua CNH, foi informado que a mesma estava cassada, pois sofreu o Autor penalidade de 07 (sete) meses de suspensão do direito de dirigir, com início de cumprimento em 27/07/2023 findo em 22/02/2024 (documento anexo); que nesta ocasião foi coagido assinar uma declaração – TERMO DE INICIO DE CUMPRIMENTO para cumprimento da penalidade, tendo sua CNH apreendida em 07/11/2023 , para cumprimento da penalidade por 07 (sete) meses; que o veículo ao qual está cadastrado com a referida a multa é de propriedade da antiga empresa onde o autor trabalhava_____________, desligado em 11/08/2020 conforme TRCT – ANEXO. "


 Decido. 

 Inicialmente, defiro o pedido de benefício da gratuidade da justiça ao autor, tendo em vista que atende ao quanto disposto no art. 99, § 3°, do CPC. 


 O art. 3º da Lei 12.153/2009 autoriza o juiz a deferir providências cautelares e antecipatórias no curso do processo, para evitar dano de difícil ou incerta reparação. Na mesma toada, o art. 300 do CPC/2015, aplicável supletivamente ao presente rito, permite ao juiz, em cognição sumária, conceder tutela de urgência quando evidenciada a probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo. 

Pois bem. Ao compulsar os autos, vislumbro os requisitos legais para deferimento da tutela de urgência pretendida. No caso em apreço, o requerente afirma que não foi regularmente notificado do processo de cassação de seu direito de dirigir, vindo a tomar conhecimento da cassação de sua carteira quando da sua renovação junto à requerida, o que geraria a nulidade do processo administrativo. 

 Todo procedimento assim como qualquer ato administrativo deve ser conduzido com estrita observância aos princípios constitucionais, sob pena de nulidade. 

 No entanto, a suspensão de dirigir foi aplicada sem a participação do autor. Ressalte-se que nos termos dos arts 5° da Resolução nº 723/2018 do CONTRAN, que dispõe sobre a uniformização do procedimento administrativo para imposição das penalidades de suspensão do direito de dirigir e de cassação do documento de habilitação. Vejamos: Art. 5º As penalidades de que trata esta Resolução serão aplicadas pela autoridade de trânsito do órgão de registro do documento de habilitação, em processo administrativo, assegurados a ampla defesa, o contraditório e o devido processo legal. Em suma, observa-se que a legislação de trânsito deixa clara a necessidade de que o autuado seja regularmente notificado de todas as etapas processuais antes da efetiva aplicação da penalidade, iniciando-se pela autuação e passando por todas as decisões dos órgãos administrativos, sendo certo que, não havendo alguma notificação, o procedimento restará viciado, eis que inviabilizado o exercício legítimo do contraditório pela parte prejudicada.

 Não obstante, o TJDFT já se pronunciou sobre questão análoga: 


CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE. INFRAÇOES DE TRÂNSITO. SUSPENSÃO DO DIREITO DE DIRIGIR. AUSÊNCIA DE PRÉVIA NOTIFICAÇÃO A RESPEITO DA INSTAURAÇAÇÃO DO PROCESSO ADMINISTRATIVO. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA DA PENALIDADE. ARTIGOS 3º, 8º, 10 E 22 DA RESOLUÇÃO Nº 192/2005 - CONTRAN. ARTIGO 265 DO CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO. 1. Nos termos do artigo 265 do Código de Trânsito Brasileiro, "As penalidades de suspensão do direito de dirigir e de cassação do documento de habilitação serão aplicadas por decisão fundamentada da autoridade de trânsito competente, em processo administrativo, assegurado ao infrator amplo direito de defesa". 2.Depois de esgotados todos os meios de defesa da infração na esfera administrativa, com a manutenção da sanção, deverá ser instaurado o processo administrativo para aplicação da penalidade de suspensão do direito de dirigir, devendo ser expedida notificação ao infrator, conforme estabelece o artigo 10º da Resolução nº 182/05, do CONTRAN - Conselho Nacional de Trânsito. 3.Inexistente a prévia notificação a respeito da instauração do processo administrativo com a finalidade de impor a penalidade de suspensão do direito de dirigir veículo automotor, mostra-se configurada a nulidade do ato administrativo. 4.Decorridos mais de 5 (cinco) anos desde a data da infração de trânsito, sem que tenha sido regularmente notificado o infrator a respeito da instauração do processo administrativo, tem-se por prescrita a pretensão de aplicação da penalidade 5. Nas demandas em que não houver condenação, os honorários advocatícios devem ser fixados nos termos do § 4º do artigo 20 da Lei Processual, mostrando-se cabível a redução da aludida verba de sucumbência, quando não observados os parâmetros expostos nas alíneas "a", "b" e "c" do § 3º do mesmo dispositivo legal, bem como os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. 6. Recurso de Apelação conhecido e parcialmente provido. No presente caso, se trata de motorista profissional que, em tese, deixou de ser notificado da penalidade de suspensão do direito de dirigir que lhe fora aplicada, o que faz com que, em cognição sumária, seja possível a concessão da tutela de urgência a fim de evitar que o requerente seja prejudicado pela aplicação de penalidade possivelmente irregular, até que, formalizado o contraditório, haja provas firmes em sentido oposto. 



Presente o perigo de dano, considerando que o requerente necessita da carteira para trabalhar e obter o sustento próprio e da família com o veículo sem incorrer em novas infrações. Por fim, registre-se que não há risco de irreversibilidade do provimento antecipado, caso o DETRAN/BA demonstre a regularidade do procedimento administrativo em questão. 


 Ante o exposto, DEFIRO A TUTELA DE URGÊNCIA pretendida, com fulcro no art. 3º da Lei 12.153/2009 e art. 300 do CPC, para determinar devolução da CNH ao autor, até decisório deste Juízo,  mantendo-se ativa a habilitação do requerente, habilitando o autor no sistema do réu, devendo o DETRAN/BA providenciar as medidas administrativas/sistêmicas cabíveis para cumprimento desta decisão no prazo de 05 (cinco) dias corridos, sob pena de multa diária de R$ 200,00 a ser aplicada por este juízo, sem prejuízo do crime de desobediência, bem como do uso de qualquer uma das medidas específicas previstas nos art. 497 e 536 do CPC, para assegurar a eficácia do provimento jurisdicional.

 Cite-se/intime-se o requerido para cumprimento da ordem e para apresentar contestação em 30 (trinta) dias, devendo informar expressamente sobre o interesse na produção de provas em audiência. Intime-se a parte requerente, por seu advogado. 

 Cumpra-se pelos meios cabíveis. 
 Atribuo à presente força de mandado/ofício, autorizada ainda a intimação por meios eletrônicos e remotos, a exemplo de e-mail, telefone, whatsapp entre outros meios eletrônicos, devidamente certificado nos autos. 
 Após finalizado o Plantão Extraordinário, venham conclusos para as deliberações pertinentes. Diligencie-se.

Juiz José Brandão Netto
PLANTÃO JUDICIÁRIO

0 Comentários