RESPOSTA: Sim.

A CF/88, em seu art. 5º, inciso XLII, giza que “a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei”, sendo referido inciso um mandado de criminalização, que teve sua regulamentação com a Lei nº 7.716/89.

No que tange à imprescritibilidade dos crimes de racismo, há divergência entre os autores. Se analisarmos a CF, esta é clara ao dispor no art. 5º, inciso XLII: “a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito á pena de reclusão, nos termos da lei”. (grifo nosso).

Como a Lei nº 7.716/89 determina em seu título a punição de crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor, categorias estas que só foram ampliadas no ano de 1.997, quando o legislador então acrescentou ao art. 1º da referida lei os termos etnia, religião e procedência nacional, passando referido art. a vigorar da seguinte forma:

“Art. 1º Serão punidos, na forma desta Lei, os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional”. (Redação dada pela Lei nº 9.459, de 15/05/97).

Assim, embora tenha o legislador ampliado às categorias protegidas pela Lei 7.716/89, acrescentando a esta a etnia, religião e procedência nacional, parte da doutrina diz que foi intenção do legislador constitucional impor imprescritibilidade apenas ao crime de racismo, ou seja, os relativos somente à raça e cor.


Gulherme de Souza Nucci critica a Lei e diz: “Aliás, fosse, na ótica do legislador, verdadeiramente sério esse crime, não teria penas atingindo o máximo de 5 anos. A maior parte das condenações não terá nem mesmo como impor a pena privativa de liberdade em regime fechado, o que somente evidencia a sua pouca importância aos olhos da Lei”, conclui o doutrinador1.

O Supremo Tribunal Federal, no HC 82424-RS, que era o caso SIEGFRIED ELLWANGER, em setembro de 2003, decidiu condená-lo por racismo. O réu vinha, dedicando-se de maneira sistemática e deliberada a publicar livros notoriamente anti-semitas, como os "Protocolos dos Sábios de Sião", denegando o fato histórico do Holocausto.

Aliás, no referido caso, o STF decidiu que o rascismo envolve discrímen de “raça, cor, credo, descendência ou origem nacional ou étnica” e não só de cor ou raça como alguns setores da doutrina vinham defendendo, pois para o Tribunal as “discriminações raciais, são compreendidas as distinções entre os homens por restrições ou preferências oriundas de raça, cor, credo, descendência ou origem nacional ou étnica.

O Suprema Corte mostrou que os crimes sob comento tem a clásula da imprescritibilidade. Eis o julgado:


HC 82424 RS Relator(a):MOREIRA ALVES Julgamento:17/09/2003 Órgão Julgador: Tribunal Pleno Publicação: Parte(s): SIEGFRIED ELLWANGERHABEAS-CORPUS. PUBLICAÇÃO DE LIVROS: ANTI-SEMITISMO. RACISMO. CRIME IMPRESCRITÍVEL. CONCEITUAÇÃO. ABRANGÊNCIA CONSTITUCIONAL. LIBERDADE DE EXPRESSÃO. LIMITES. ORDEM DENEGADA.1. Escrever, editar, divulgar e comerciar livros "fazendo apologia de idéias preconceituosas e discriminatórias" contra a comunidade judaica (Lei 7716/89, artigo 20, na redação dada pela Lei 8081/90) constitui crime de racismo sujeito às cláusulas de inafiançabilidade e imprescritibilidade (CF, artigo 5º, XLII).
  1. Aplicação do princípio da prescritibilidade geral dos crimes: se os judeus não são uma raça, segue-se que contra eles não pode haver discriminação capaz de ensejar a exceção constitucional de imprescritibilidade. Inconsistência da premissa.
  2. (SIC)
7. A Constituição Federal de 1988 impôs aos agentes de delitos dessa natureza, pela gravidade e repulsividade da ofensa, a cláusula de imprescritibilidade, para que fique, ad perpetuam rei memoriam, verberado o repúdio e a abjeção da sociedade nacional à sua prática.
(sic) 12. Discriminação que, no caso, se evidencia como deliberada e dirigida especificamente aos judeus, que configura ato ilícito de prática de racismo, com as conseqüências gravosas que o acompanham. 13. Liberdade de expressão. Garantia constitucional que não se tem como absoluta. Limites morais e jurídicos. O direito à livre expressão não pode abrigar, em sua abrangência, manifestações de conteúdo imoral que implicam ilicitude penal. 14. As liberdades públicas não são incondicionais, por isso devem ser exercidas de maneira harmônica, observados os limites definidos na própria Constituição Federal (CF, artigo 5º, § 2º, primeira parte). O preceito fundamental de liberdade de expressão não consagra o "direito à incitação ao racismo", dado que um direito individual não pode constituir-se em salvaguarda de condutas ilícitas, como sucede com os delitos contra a honra. Prevalência dos princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade jurídica. 15. "Existe um nexo estreito entre a imprescritibilidade, este tempo jurídico que se escoa sem encontrar termo, e a memória, apelo do passado à disposição dos vivos, triunfo da lembrança sobre o esquecimento". No estado de direito democrático devem ser intransigentemente respeitados os princípios que garantem a prevalência dos direitos humanos. Jamais podem se apagar da memória dos povos que se pretendam justos os atos repulsivos do passado que permitiram e incentivaram o ódio entre iguais por motivos raciais de torpeza inominável. 16. A ausência de prescrição nos crimes de racismo justifica-se como alerta grave para as gerações de hoje e de amanhã, para que se impeça a reinstauração de velhos e ultrapassados conceitos que a consciência jurídica e histórica não mais admitem. Ordem denegada”.


A defesa do réu alegou que a pretensão punitiva se encontraria prescrita, afirmando a defesa que a Constituição Federal limita a imprescritibilidade aos crimes de racismo a preconceitos decorrentes de raça, cor e não incluiria etnia, religião ou procedência nacional conforme propugnam alguns autores, contudo, com o julgamento, o STF decidiu que a imprescritibilidade também atingia preconceito por motivos religiosos.

Já em relação à procedência nacional, esta ainda não foi objeto de deliberação pelo STF, porém, após o caso Ellwanger, caso referida matéria seja levada ao Plenário, o posicionamento da imprescritibilidade deve ser majoritário pelos ministros, pois no próprio julgado, evidenciou-se que as discriminações raciais, podem decorrer de distinções ou preferências oriundas de raça, cor, credo, descendência ou origem nacional ou étnica.

Assim, há de se entender que todos os crimes previsto, na Lei 7.716/89 – Lei do Racismo são imprescritíveis, diante do mandamento constitucional do 5º, inciso XLII, e diante da posição do STF acima explanada, mas outras formas discriminatórias pevistas em outras leis, fora da lei sob comento, não se inclui na clásusula de imprescritibilidade, como, por exemplo, a Lei 12.984, que criminaliza a conduta de quem discrimina o portador de HIV.

Abcs a todos, José Brandão Netto, Juiz de Direto na BA.


1NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e processuais comentadas. Vol.1. Pág. 188 

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