"Não se pune a conduta do agente que se utiliza de meios corretivos apenas no mero exercício do direito de correção (jus corrigendi), sem cometer abusos decorrente deste direito."XPUBLICADA EM 04-09-2018 TJDF = E M E N T A  PENAL E PROCESSO PENAL. LESÃO CORPORAL. EXERCÍCIO REGULAR DIREITO DO JUS CORRIGENDI. AUSÊNCIA DE EXCESSO DOS MEIOS DISCIPLINADORES. EXCLUSÃO DE ILICITUDE. EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA. PEDIDO PREJUDICADO.
1. Não há crime quando o agente pratica o fato em estrito cumprimento no exercício regular de direito (art. 23, inciso III do Código Penal).
2. Verifica-se a excludente de ilicitude na conduta do réu que se utilizou de meios pedagógicos no mero exercício do direito de correção (jus corrigendi), sem cometer qualquer excesso.
3. Julga-se prejudicado o pedido de execução provisória de pena em face da absolvição do apelante.
4. Recurso conhecido e provido.
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Apelação 20160810072306APR
A C Ó R D Ã O
Acordam os Senhores Desembargadores da 3ª TURMA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, JOÃO BATISTA TEIXEIRA - Relator, JESUINO RISSATO - 1º Vogal, DEMETRIUS GOMES CAVALCANTI - 2º Vogal, sob a presidência do Senhor Desembargador JESUINO RISSATO, em proferir a seguinte decisão: CONHECER E DAR PROVIMENTO AO RECURSO. UNÂNIME. , de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas.
Brasilia (DF), 30 de Agosto de 2018.
Documento Assinado Eletronicamente
JOÃO BATISTA TEIXEIRA
Relator
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Apelação 20160810072306APR
R E L A T Ó R I O
A. J. S. M. O. interpôs APELAÇÃO CRIMINAL contra a sentença de fls. 145-147v, proferida pelo Juízo da Segunda Vara Criminal do Paranoá, que o condenou como incurso no art. 129, § 9º, do Código Penal, à pena de 3 meses de detenção, no regime inicial aberto, bem como suspendeu a execução da pena por 2 anos.
Consta da denúncia que, no dia 12.11.2016, por volta das 18h, na quadra 342, lote 5, Del Lago, Itapoã, o apelante, de forma livre e consciente, ofendeu a integridade física de seu enteado P.Y.R.C..
Segundo a inicial acusatória, na data e local mencionados, o réu estava em casa com P.Y.R.C. e sua filha de 8 meses de idade. Narra que o ofendido pegou a criança no colo e deixou que ela caísse no chão, momento em que o acusado lhe desferiu ao menos 3 tapas, o que lhe causou hematomas, conforme o laudo de fls. 41-41v.
A defesa, em suas razões de fls. 156-158, requer a reforma da sentença para absolver o apelante, sob o argumento de que ele agiu acobertado por excludente de ilicitude porque praticou o fato no exercício regular de direito (art. 23, inciso III, 2ª parte, do Código Penal), visando apenas “corrigir seu enteado” (jus corrigendi). Subsidiariamente, postula a limitação de fim de semana como condição para a suspensão da execução da pena, uma vez que a prestação de serviço à comunidade prejudicaria o trabalho de pedreiro do acusado.
O Ministério Público, nas contrarrazões de fls. 161, manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do recurso.
A Procuradoria de Justiça, no parecer de fls. 166-169, opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso. Requereu, ainda, a execução provisória da pena na forma decidida no Habeas Corpus nº 126.292/SP – STF.
É o relatório.
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V O T O S
O Senhor Desembargador JOÃO BATISTA TEIXEIRA - Relator
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso. a) Pedido de absolvição por excludente de ilicitude.
Materialidade incontroversa
A materialidade do delito de lesão corporal restou demonstrada pelo auto de prisão em flagrante (fls. 3-5), pela ocorrência policial (fls. 8-11) e pelo laudo de lesão corporal, o qual registra que o ofendido apresentava "equimoses violáceas externas compreendendo em (sic) toda região dorsal, em faixas, compatível com marcas de mão" (fls. 7-7v).
Autoria sobejamente provada
A autoria do mencionado delito, de igual modo, está suficientemente demonstrada nos autos e não foi objeto de recurso.
Na delegacia, L.R.C., mãe do ofendido, narrou que convive com o acusado há cerca de 3 anos, tem uma filha em comum de 8 meses de idade e dois filhos de outro relacionamento: P.Y.R.C. e I.. Narrou que trabalhava em seu salão de beleza, quando o apelante chegou e contou que P.Y.R.C. derrubou o filho do casal no chão. Declarou que ele levou a criança até o local e verificou que ela não tinha se machucado. Relatou que P.Y.R.C. disse que foi agredido por seu padrasto A.J.S.M.O. com três tapas nas costas porque derrubou a irmã no chão. Afirmou que o ofendido apresentava um grande hematoma na parte superior das costas e que ele reclamou de dores ao se movimentar. O réu confirmou que agrediu P.Y.R.C. com um tapa (fls. 4).
Em juízo, L.R.C. confirmou seu depoimento prestado na delegacia. Declarou que encontrou seu filho e constatou que havia um hematoma nas costas dele. O ofendido falou que derrubou a irmã no chão e foi agredido pelo réu. O apelante confirmou que golpeou P.Y.R.C. com a mão (vídeo - fls. 108).
O apelante, na delegacia, disse que seu enteado P.Y.R.C. derrubou sua filha de 8 meses no chão, razão pela qual "ficou nervoso e deu um tapa" no ofendido (fls. 5).
Em juízo, o réu confessou os fatos descritos na denúncia. Relatou que P.Y.R.C. foi brincar com sua filha e derrubou a criança da cama. Informou que ficou nervoso com a situação e desferiu um tapa contra as costas seu enteado, o que causou uma "marca" porque ele estava sem camisa (vídeo - fls. 108).
Com efeito, o laudo de exame de corpo de delito registra que o
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ofendido apresentava "equimoses violáceas externas compreendendo em (sic) toda região dorsal, em faixas, compatível com marcas de mão" (fls. 7-7v).
Assim, não há dúvidas de que o réu agrediu seu enteado com um tapa.
Em relação ao pedido de absolvição por excludente de ilicitude, verifica-se que assiste razão à defesa, uma vez que o réu agiu com o objetivo de corrigir o comportamento do enteado, que ficava sob seus cuidados enquanto a genitora dele estava no trabalho.
O inciso III do art. 23 do Código Penal prevê que "não há crime quando o agente pratica o fato, em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito".
Constata-se que o apelante agiu no exercício regular do direito de correção e que não houve a intenção de simplesmente agredir o enteado, mas simplesmente usar de modo motivado e moderado o direito de corrigir o comportamento dele.
Não se observa também qualquer excesso por parte do acusado, uma vez que desferiu apenas um tapa com o intuito de demonstrar de maneira pedagógica o erro de seu enteado.
Nesse sentido já decidiu este Tribunal:
I - Não havendo provas suficientes a demonstrar que o réu tenha excedido o regular exercício do direito de correção de sua enteada, a manutenção da absolvição é medida que se impõe.
(Acórdão n.1064080, 20141310033316APR, Relator: NILSONI DE FREITAS CUSTODIO 3ª TURMA CRIMINAL, Data de Julgamento: 30/11/2017, Publicado no DJE: 05/12/2017. Pág.: 181/185 - Grifou-se).
(...) 1 - Não se pune a conduta do agente que se utiliza de meios corretivos apenas no mero exercício do direito de correção (jus corrigendi), sem cometer abusos decorrentes deste direito.
(Acórdão n.960495, 20130210060159APR, Relator: CESAR LOYOLA, Revisor: ROBERVAL CASEMIRO BELINATI, 2ª
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Apelação 20160810072306APR
TURMA CRIMINAL, Data de Julgamento: 18/08/2016, Publicado no DJE: 23/08/2016. Pág.: 93/109).
Importante ressaltar que se cuida de um fato isolado na vida da família, sendo evidente que não se trata de reiterados abusos físicos cometidos contra o ofendido.
Ante o exposto, absolve-se o réu o delito de lesão corporal, com fulcro no inciso III do art. 386 do Código de Processo Penal, uma vez que restou demonstrado que o réu exerceu seu direito de correção e não houve qualquer excesso de sua parte.
b) Suspensão condicional do processo.
A defesa postula a limitação de fim de semana como condição para a suspensão da execução da pena, uma vez que a prestação de serviço à comunidade prejudicaria o trabalho de pedreiro do acusado.
Julga-se prejudicado o presente pedido em face da absolvição do apelante.
c) Execução provisória da pena.
Da mesma maneira, está prejudicado o pedido da Procuradoria de Justiça, uma vez que o réu foi absolvido.
Posto isso, voto no sentido de CONHECER e DAR PROVIMENTO ao recurso, a fim de absolver A.J.S.M.O. do delito previsto no art. 129, § 9º, do Código Penal, com fulcro no inciso III do art. 386 do Código de Processo Penal.
É como voto.

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