A relevância da lista tríplice para a PGR
Discute-se se
acerca da obrigatoriedade de o presidente da República observar os nomes da
lista tríplice para a escolha do próximo procurador-geral da República.
Com
a proximidade do final do mandato da atual PGR (procuradora-geral da
República), questiona-se a necessidade de observância da lista tríplice para
fins de preservação dos princípios democráticos, republicanos, e de preservação
da total autonomia e independência da PGR (Procuradoria-Geral da República).
Em relação à democracia interna, esta ficaria assegurada,
porque o escrutínio da classe submeteria o candidato à sabatina dos próprios
colegas, e a um sistema de votação onde todos pudessem discutir as propostas e participar da respectiva escolha até
ulterior fase do processo de votação.
No
que se refere à independência da PGR, esta ficaria inteiramente resguardada, já
que o candidato escolhido exerceria suas funções de forma livre e independente
de eventuais pressões externas ou políticas, sendo devidamente legitimado para
liderar e administrar a instituição.
Quanto ao princípio
republicano, sua relação estaria adstrita à temporariedade do mandato, aliada à
legitimidade do eleito perante seus pares, e à prestação de contas a que
estaria submetido quanto às promessas feitas em sua campanha interna.
De
outro lado, discute-se se o procurador-geral poderia ser membro de outro ramo
do MPU (Ministério Público Militar, Ministério Público do Trabalho, Ministério
Público do Distrito Federal) ou apenas membro do MPF (Ministério Público Federal).
Nesse
ponto, o art. 128, §1º, da Carta Magna expressamente previu que a escolha do
procurador-geral seria determinada, dentre os integrantes da carreira (singular),
in verbis:
"Art. 128, § 1º O
Ministério Público da União tem por chefe o Procurador-Geral da República,
nomeado pelo Presidente da República dentre integrantes da carreira,
maiores de trinta e cinco anos, após a aprovação de seu nome pela maioria
absoluta dos membros do Senado Federal, para mandato de dois anos, permitida a
recondução."
Com efeito, o comando
Constitucional foi reproduzido no art. 25 da Lei Complementar nº 75/93, a qual
dispõe que o Procurador-Geral da República é o chefe do Ministério Público da
União, nomeado pelo Presidente da República, dentre integrantes da carreira
maiores de trinta e cinco anos, permitida a recondução.
Por seu turno ,o art. 43, I, da
Lei Complementar 75/93, dispõe que o Procurador- Geral da República é órgão do
Ministério Público Federal, enquanto o art. 45 determina que "o
Procurador-Geral da República é o Chefe do Ministério Público Federal".
Ademais, o art. 45 da Lei
Complementar n.º 75/93 estabelece que o PGR será o chefe do Ministério Público
Federal (MPF). Logo, a interpretação lógica e sistemática cabível é a de que
somente poderá ser nomeado um integrante do MPF.
De outro lado, não há que se
falar em obrigatoriedade de nomeação dentre titulares do cargo de
subprocurador-geral da República. Com efeito, se a lei não fez tal distinção,
deve-se seguir a regra hermenêutica " onde a lei não distinguiu,
não cabe ao intérprete fazê-lo".(MAXIMINIANO, p. 246).
Logo , pode ser nomeado tanto
um procurador da República, procurador regional da República ou
subprocurador-geral da República, desde que preencha os requisitos
estabelecidos no art. 128,§1º, da Constituição.Não é outro o entendimento
de CALABRICH, para quem:
"A regulamentação de uma
lista tríplice institucional mediante consulta ao colégio de Procuradores
somente poderá criar regras procedimentais, como prazos, formalidades para
inscrições, votação, apuração dos votos e divulgação. O ato normativo não
poderá criar nenhum requisito para quem desejar concorrer ao cargo; no máximo,
poderá reproduzir os requisitos que já constam na Constituição: integrar a
carreira e ser maior de trinta e cinco anos. Qualquer limitação adicional –
por exemplo, para afirmar que somente Subprocuradores-gerais da República podem
candidatar-se, excluindo Procuradores da República e Procuradores Regionais da
República – estaria em franco descompasso com o art. 128 da Constituição. A
redação atual do anteprojeto não incide nesse equívoco" (grifos
acrescidos).
Em relação à obrigatoriedade de
o presidente seguir a lista, cumpre ressaltar que, embora a Constituição não
tenha estabelecido referida normatização, a tradição histórica alusiva à sua
observância (desde 2003) já consolidou aquilo que a doutrina intitulou "
costume constitucional", o qual se configura na reiteração de
comportamentos por parte Órgãos soberanos, criando uma legítima expectativa de
que não será rompida determinada tradição.
Nesse sentido, preleciona ARAS:
"Como ocorre desde 2003
no MPF, tais listas tríplices para PGR vêm sendo respeitadas pelos
sucessivos presidentes da República. Evidentemente, os escolhidos têm
sido selecionados dentre os membros do MPF, observando-se o
§1º do art. 128 da CF. É seguro dizer, portanto, que já se constituiu ou se está em
vias de constituir um costume constitucional para sua
observância, costume este que resulta da reiteração do comportamento dos órgãos
de soberania competentes, isto é, a presidência da República e o Senado
Federal" (grifos nossos).
Ainda sobre a temática do
costume constitucional, leciona Emanuel Melo Ferreira:
"O costume, como se sabe, é
uma das fontes do direito, consistindo naquela prática reiterada de um
determinado uso, com a consciência de que tal conduta é obrigatória. Assim, o
costume apresenta um aspecto objetivo (condutas reiteradas) e subjetivo
(consciência de obrigatoriedade). Um costume pode ser caracterizado como
constitucional quando ele complementa uma lacuna da Constituição. Tal
complementação pode ser levada a cabo por quaisquer dos poderes constituídos,
como, por exemplo, o Poder Executivo. Se tal complementação, a saber, se tal
conduta é efetivada de modo reiterado, com a consciência de sua obrigatoriedade
e sem a violação de quaisquer outros dispositivos constitucionais, tem-se um
costume constitucional, fonte, portanto, do Direito Constitucional"
(grifos acrescidos).
Por outro lado, 0 artigo 128 da
Constituição, em seu parágrafo 3º, disciplina que os Ministérios Públicos dos
Estados e o do Distrito Federal e Territórios formarão lista tríplice, dentre
integrantes da carreira, para a escolha de seu procurador-geral, que será
nomeado pelo Governador do Estado.
Cumpre salientar que a lista
tríplice tem previsão constitucional para nomeação dos Juízes do Tribunal
Regional Eleitoral (art. 121 da CF/88), Ministros do Tribunal Superior
Eleitoral (art. 128 da CF/88), e vem sendo tradicionalmente observada pelo
presidente da República em relação à escolha dos indicados.
Além disso, é uma realidade na
nomeação do secretário da Receita Federal, procurador-geral Federal,
procurador-geral do TCE (Tribunal de Contas do Estado), Ministros do TCU( art.
73,§1º,I, da CF/88), Desembargadores do TRF (art. 94, §único, da CF/88),
Ministros do STJ (art. 104,I, da CF/88), Reitores de Universidades Federais, e
no âmbito dos Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) e Conselho
Nacional de Justiça (CNJ), sendo instrumento de exercício da democracia interna
e legitimação dos eleitos.
Em relação à aplicabilidade da
lista em outros países, lecionam Coelho e Barberá:
"(...)Vários países,
especialmente os latino-americanos, também utilizam variantes desse sistema
para nomear os membros de tribunais de justiça e outros cargos públicos. Este
sistema de lista tríplice é conhecido como “rule of three names” nos Estados
Unidos, “regla de la terna” na Espanha (....)Às vezes, o número de
candidatos na lista é maior do que três e, por isso, este sistema é conhecido
como “regra dos k nomes”. Esta família de regras possui muitas variantes, com
diferentes especificações, que podem ser determinantes no resultado final da
nomeação. Por exemplo, no Chile, os membros da Suprema Corte são nomeados pelo
presidente da República a partir de uma lista quíntupla proposta pelos membros
desse tribunal(...)".
CONCLUSÃO:
Diante dos princípios
democráticos, republicanos, e visando garantir a independência e autonomia
total da procuradoria-geral da República, espera-se que o presidente da
República observe, na nomeação do próximo PGR, o nome de um dos integrantes da
lista tríplice, a qual será encaminhada ao Chefe do Poder Executivo pela
Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR).
Leandro Bastos Nunes é procurador da República, ex-advogado da União, professor de cursos do MPU, especialista em Direito Penal e Processo Penal e graduado em Direito pela Universidade Federal da Bahia (UFBA).
REFERÊNCIAS:
ARAS, Vladimir. A origem
da lista tríplice para a escolha dos Chefes do Ministério Público.
Disponível em https://vladimiraras.blog/2018/10/12/a-origem-da-lista-triplice-para-a-escolha-dos-chefes-do-ministerio-publico/.
Acesso em 11 de maio/2019.
CALABRICH, Bruno Freire de
Carvalho. A escolha do procurador-geral da República por lista
tríplice institucional – Parte II. Disponível em https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/a-escolha-do-procurador-geral-da-republica-por-lista-triplice-institucional-parte-ii-13022019.
Acesso em 11 de maio de 2019.
COELHO, Danilo; BARBERÁ,
Salvador. O Sistema de Lista Tríplice nos Tribunais Judiciais Brasileiros.
Disponível em https://ipea.gov.br/agencia/images/stories/PDFs/boletim_analise_politico/141117_boletim_analisepolitico_06_cap8.
Acesso em 18 de maio de 2019.
FERREIRA, Emanuel Melo. A indicação
de Membros do MPF para o cargo de procurador Geral da República como exemplo de
costume constitucional. Disponível em em https://constituicaoedemocracia.com/2013/04/06/a-indicacao-de-membros-do-mpf-para-o-cargo-de-procurador-geral-da-republica-como-exemplo-de-costume-constitucional/.
Acesso em 11 de maio de 2019.
MAXIMINIANO, Carlos. Hermenêutica
e Aplicação do Direito. Forense: Rio de Janeiro, 1994.
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