Com base no princípio da insignificância, juiz absolve réu que tentou furtar camisa do Bahia, mas diz que o time tem camisa mais pesada do Norte/Nordeste
"Ainda que do ponto de vista do futebol, o Esporte Clube Bahia tenha a camisa mais "pesada" no Norte/Nordeste do Brasil, sendo um time de vultosa importância no cenário nacional, no caso concreto, da tentativa de furto de uma camisa do referido time, diga-se de passagem, Bicampeão Brasileiro da 1a divisão, sendo único time fora do Sul-Sudeste do Brasil a levantar a referida taça, não há como deixar de aplicar o princípio sob comento.
Ante todo exposto, ABSOLVO SUMARIAMENTE O ACUSADO",
Desse modo sentenciou o juiz José Brandão Netto, da Vara Criminal de Araci-BA, ao aplicar o princípio da insignificância para absolver um jovem de 29 anos pelo furto qualificado de uma camisa do Esporte Clube Bahia, time da 1a Divisão do Brasileirão.
O julgador ponderou que o valor total do furto é “insignificante”. O furto ocorreu em 5/12 de 2014, num estabelecimento comercial da cidade
O Ministério Público (MP) havia denunciado o réu pelo crime, alegando que o " denunciado escalou uma grade de acesso onde funciona o bar do estabelecimento comercial — Posto Aliança - e subtraiu, com ânimo de apossamento definitivo, 01 (uma) camisa do Esporte Clube Bahia."
Restou apurado, ainda, no bojo do procedimento investigatório, que o denunciado após subtrair a camisa do bar e lanchonete deste posto, tentou adentrar na área dos caixas quando foi surpreendido e contido peio vigilante do estabelecimento"
No entanto, o magistrado, mesmo sendo torcedor fervoroso do Bahia, absolveu réu com base no princípio da insignificância.
“Há de se reconhecer que não subsiste o caráter delitivo do fato narrado na denúncia, ainda mais que se trata de crime tentado e não consumado". O Juiz reconheceu no caso concreto as quatro condições delineadas pelo Supremo Tribunal Federal para a aplicação desse princípio.
Os requisitos do STF são: mínima ofensividade da conduta, nenhuma periculosidade social da ação, reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e inexpressividade da lesão jurídica provocada.
A absolvição foi fundamentada no artigo 397, inciso III (não constituir o fato infração penal), do Código de Processo Penal.
Segue a sentença abaixo:
Processo: AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO n. 0001905-95.2014.8.05.0014
Órgão Julgador: VARA CRIMINAL DE ARACI
AUTOR: Ministério Público do Estado da Bahia
Advogado(s):
REU: ___
Advogado(s): ROBENILSON GONCALVES SANTOS JUNIOR (OAB:BA63663), EVERTON JOSE ARAUJO DO NASCIMENTO (OAB:BA59759)
SENTENÇA
RELATÓRIO
O Ministério Público do Estado ofereceu denúncia em face de ____, em razão de o acusado, no dia 05/12/2014, ter tentado subtrair uma camisa do Esporte Clube Bahia.
Segundo Ministério Público do Estado , " o denunciado. escalou uma grade de acesso onde funciona o bar do estabelecimento comercial — Posto Aliança - e subtraiu, com ânimo de apossamento definitivo, 01 (uma) camisa do Esporte Clube Bahia.
Restou apurado, ainda, no bojo do procedimento investigatório, que o denunciado após subtrair a camisa do bar e lanchonete deste posto, tentou adentrar na área dos caixas quando foi surpreendido e contido peio vigilante do estabelecimento".
Por este motivo, foi detido pelo segurança do estabelecimento.
Fundamentação
Sem querer adentrar afundo no mérito do caso sub judice, em análise dos autos, verifica-se que o caso em tela revela a inexistência de crime, em razão da atipicidade do fato.
Deveras, constatar-se a configuração da tipicidade formal, traduzida pela prática de conduta prevista no art. 155, caput, do CP, qual seja tentativa de subtração de coisa alheia móvel. Entretanto, não restou caracterizada a presença da tipicidade material, assim entendida como a relevante lesão ou ameaça de lesão ao bem jurídico.
Bastante pertinente é o magistério de Rogério Grecco transcrito a seguir:
“Já tivemos a oportunidade de salientar que o fato típico é composto pela conduta do agente, dolosa ou culposa, comissiva ou omissiva; pelo resultado; bem como pelo nexo de causalidade, entre aquela e este, e , por fim, pela tipicidade formal e conglobante”.
Ainda, segundo o referido doutrinador, a tipicidade conglobante tem como requisito a tipicidade material, que é a necessidade de a conduta típica ter relevância jurídica, não podendo o Direito Penal se ocupar com lesões insignificantes, pois o resultado não é socialmente reprovável, daí se falar em princípio da insignificância, da intervenção mínima, pois quando o legislador criou o tipo de furto, o mesmo se preocupou com furtos que possuíssem gerassem prejuízo à sociedade, ou seja, o legilador não tencionava legislar para coibir furtos de bagatela.
No caso dos autos, percebe-se a o desvalor da conduta perpetrada, ao tempo em que não se constata a produção de um resultado socialmente reprovável, que seja capaz de justificar a aplicação dos rigores efeitos do Direito Penal, em obediência aos princípios da Fragmentariedade e Intervenção Mínima, que norteiam esta ciência.
O reconhecimento da atipicidade do fato não conduz à impunidade da conduta, apenas limita as suas consequências, afastando a incidência do Direito Penal, reservando a aplicação de outras ciências jurídicas
Adotamos, pois, o entendimento esposado na doutrina internacional de Claus Roxin e defendida no Brasil por Rogério Grecco, Cezar Bitercourt e Mirabete, dentre outros.
In casu, trata-se de inexistência de tipicidade material, pela ausência de lesividade da conduta ( tentativa de furto de 1 camisa do Esporte Clube Bahia ).
Segundo o STJ, “o princípio em questão "significa dizer que a intervenção do direito penal apenas se justifica quando o bem jurídico tutelado tenha sido exposto a um dano impregnado de significativa lesividade. Não havendo, outrossim, a tipicidade material, mas apenas a formal, a conduta não possui relevância jurídica, afastando-se, por conseqüência, a intervenção da tutela penal, em face do postulado da intervenção mínima".
Esse princípio está relacionado com aqueles crimes que não são capazes de lesar ou no mínimo colocar em perigo o bem jurídico tutelado, ou seja, são casos que é vedada a atuação do Estado
Quanto aos requisitos, se resume, basicamente, aos requisitos objetivos relacionados ao fato, e os requisitos subjetivos, vinculados ao agente e à vítima. Por esse motivo, deve ser analisado de acordo com o caso concreto.
Requisitos para o “princípio da insignificância” ou bagatela própria:
São quatro os requisitos objetivos exigidos nesse princípio : mínima ofensividade da conduta do agente, inexistência de periculosidade social do ato, reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e inexpressividade da lesão jurídica causada.
De outra banda, a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) fixou regra para a aplicação do princípio da insignificância, limitando o reconhecimento para casos em que a res furtiva não ultrapasse 10% do salário mínimo vigente à época dos fatos. A decisão (HC 626.351/SC) teve como relator o ministro Ribeiro Dantas.
Deste modo, seja em virtude do Princípio da Intervenção Mínima do Direito Penal ou da Insignificância, há de se reconhecer que não subsiste o caráter delitivo do fato narrado na denúncia, ainda mais que se trata de crime tentado e não consumado.
Se fosse um furto consumado, poder-se-ia pensar em se aplicar o limite de 10 % do salário mínimo como teto máximo para aplicação do princípio da insignificância e se rejeitar a aplicação deste, mas ,como dito anteriormente, o crime foi tentado e o réu ainda foi deito na época.
Ainda que do ponto de vista do futebol , o Esporte Clube Bahia tenha a camisa mais "pesada" no Norte/Nordeste do Brasil, sendo um time de vultosa importância no cenário nacional, no caso concreto, da tentativa de furto de uma camisa do referido time, diga-s de passagem, Bicampeão Brasileiro da 1a divisão, sendo único time fora do Sul-Sudeste do Brasil a levantar a referida taça, não há como deixar de aplicar o princípio sob comento.
DISPOSITIVO:
Ante todo exposto, ABSOLVO SUMARIAMENTE O ACUSADO, com fundamento no artigo 397, III, do CPP.
Sem custas.
Transitado em julgado, arquivem-se os autos.
P.R.I.
Araci/BA, 22 de abril de 2024.
José Brandão Netto
Juiz de Direito"
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